segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Juíza Federal julga Ação Civil Pública do Condomínio Sampaio Correia

A Juíza Federal Gisele Maria da Silva Araújo Leite, da 4a Vara Federal, Julgou procedente, em parte, a Ação Civil Pública No 2004.84.00.008808-7, impetrada pelo Procurador da República Yordan Moreira Delgado, concedendo revisão de cláusulas contratuais consideradas abusivas, aos moraores do Condomínio Residencial Sampaio Correia, localizado à 1a Travessa Sampaio Correia, 80, no bairro de Dix-Sept Rosado, em Natal.

Na ação, a CAIXA e a construtora CONnível foram obrigadas a reparar os vícios construtivos das unidades do citado empreendimento. Todavia, o que se vê ainda é a reclamação dos moradores alegando a ineficiência do serviço prestado pela CONnível, devido a serviço inacabado, tais como: cerâmicas que foram reaproveitadas, a cerâmica das paredes das cozinhas e dos banheiros não foram substituídos, mas somente o piso, ficando um contraste entre a cor e a qualidade da cerâmica do piso e das paredes, em vários apartamentos (principalmente do térreo) as cerâmicas do piso não foram substituídas, além de outros vícios construtivos que ainda permanecem.



VEJA A SENTENÇA NA ÍNTEGRA:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - CLASSE 5025
Processo nº 2004.84.00.008808-7
Autor : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Procurador da República : Dr. Yordan Moreira Delgado
Réus : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA, CONNÍVEL CONSTRUÇÕES E SERVIÇOS LTDA. e ABREU IMÓVEIS LTDA.



S E N T E N Ç A


EMENTA: CONSUMIDOR. PAR - PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL. CONDOMÍNIO RESIDENCIAL SAMPAIO CORREIA. NULIDADE DE CLÁUSULAS DE CONTRATO DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL. RECONHECIMENTO PARCIAL, COM A REINSCRIÇÃO DE ALGUMAS DELAS E EXCLUSÃO DE OUTRAS DA AVENÇA. RESPONSABILIDADE CIVIL DA CAIXA E DA CONSTRUTORA PELOS VÍCIOS CONSTRUTIVOS VERIFICADOS NO EMPREENDIMENTO. PRESENÇA DOS REQUISITOS DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA PREVISTA NO ART. 20 DO CDC E DA SOLIDARIEDADE ESTATUÍDA NO ART. 7º DA MESMA LEGISLAÇÃO. DEVER SOLIDÁRIO DE REPARAR AS FISSURAS, OS VAZAMENTOS E AS INFILTRAÇÕES DETECTADAS COMO DEFEITOS DE CONSTRUÇÃO. INEXISTÊNCIA DO DIREITO DOS ARRENDATÁRIOS À ADMINISTRAÇÃO E NORMATIZAÇÃO DO CONDOMÍNIO. REGULARIDADE DO CONTRATO TRAVADO ENTRE A CAIXA E A ABREU IMÓVEIS PARA ADMINISTRAÇÃO DO RESIDENCIAL. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO.
1 - No julgamento da ADIn nº 2591, o Augusto STF assentou que as normas do Código de Defesa do Consumidor - CDC são plenamente aplicáveis às relações mantidas pelas instituições bancárias com seus clientes, a exemplo da relação travada entre a CAIXA e os adquirentes das unidades autônomas do Condomínio Residencial Sampaio Correia, por meio de contrato de arrendamento residencial.
2 - Comprovada, in casu, a abusividade de cláusulas previstas no contrato-tipo travado entre a CAIXA e os adquirentes das unidades habitacionais do Residencial em apreço, nos termos do art. 51 da legislação consumerista, impõe-se a declaração de sua nulidade, de modo que sejam extirpadas aquelas inservíveis e revisadas as demais. Exclusão do parágrafo 1º da cláusula 19ª; da alínea c da cláusula 20ª; e da cláusula 24ª e reinscrição das cláusulas de nºs. 5; 15, §§ 5º e 7º; 16, § 2º; 17; 18; 19, caput e inciso II, b; 21, parágrafo único; e 22.
3 - Nos termos do art. 20 do CDC, o fornecedor de serviços, independentemente da existência de culpa, responde pelos vícios e defeitos decorrentes de sua atividade que venham a tornar o serviço impróprio ao consumo ou lhe diminuam o valor.
4 - Demonstrada, pelo conjunto probatório colacionado aos autos, a existência de vícios construtivos no empreendimento em comento, especialmente de fissuras, vazamentos e infiltrações nas unidades autônomas e nas áreas comuns do Condomínio, decorrentes da má construção da obra de engenharia, imperioso se mostra o reconhecimento da responsabilidade civil da construtora e da CAIXA pela reparação dos danos respectivos. A primeira, em vista de ser responsável pela edificação do empreendimento e a segunda, por ter descurado do seu dever de fiscalizar a construção e ser responsável pela inserção do empreendimento no mercado de consumo.
5 - Reconhecimento da responsabilidade solidária da CAIXA e da CONNÍVEL, nos termos do art. 7º da legislação consumerista.
6 - Enquanto os imóveis arrendados pertencerem ao FAR - Fundo de Arrendamento Residencial, o qual é gerido pela CAIXA, esta permanecerá com o direito de administrá-los, não havendo que se falar em direito dos arrendatários à administração e normatização do Condomínio.
7 - Regularidade do contrato travado entre a CAIXA e a empresa ABREU IMÓVEIS para administração do Condomínio Residencial Sampaio Correia, pois o mesmo foi precedido do necessário procedimento licitatório e travado com base no estatuído no art. 17 do Regimento Interno do Condomínio.
8 - Procedência parcial do pedido.


Vistos etc.


I - RELATÓRIO

Trata-se de Ação Civnil Pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF, representado pelo Procurador da República Yordan Moreira Delgado, em desfavor da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA, da CONNÍVEL CONSTRUÇÕES E SERVIÇOS LTDA. e da ABREU IMÓVEIS LTDA., objetivando a prolação de provimento jurisdicional que condene a CAIXA e a construtora-ré a, solidariamente, corrigirem na totalidade os vícios construtivos existentes nos imóveis que constituem o Condomínio Residencial Sampaio Correia, situado nesta Capital; que declare nulas determinadas cláusulas contratuais, eliminando-as do contrato travado entre a CAIXA e os beneficiários do PAR - Programa de Arrendamento Residencial ou adaptando-as às normas do Código de Defesa do Consumidor - CDC; e que declare a nulidade do contrato celebrado entre a CAIXA e a ABREU IMÓVEIS, quanto à prestação de serviços no Residencial em comento, do regimento interno e da convenção de condomínio instituídos pela CAIXA, bem como do ato de nomeação do síndico.
A título de antecipação da tutela de mérito, requer seja proferido édito jurisdicional que: a) obrigue a CAIXA e a construtora-demandada a procederem, em prazo a ser assinado pelo Juízo, ao início das obras emergenciais de reparo nos imóveis que constituem o Condomínio Residencial Sampaio Correia, sanando especialmente os vícios que obstam o pleno aproveitamento das unidades habitacionais, tais como as obras concernentes a esgotos, defeitos elétricos e vazamento no reservatório de água, devendo referidas rés apresentarem em Juízo, antes do início das obras, projeto de engenharia e cronograma físico-financeiro dos reparos a ser executados; b) suspenda, em relação ao Residencial Sampaio Correia, o contrato de prestação de serviços vigente entre a CAIXA e a ABREU IMÓVEIS, permitindo aos arrendatários, mediante fiscalização da primeira requerida, decidir sobre a forma de administração do condomínio, facultando-lhes, inclusive, a escolha do síndico, na forma da lei; e c) comine multa de R$ 2.000,00 às rés CAIXA e CONNÍVEL, por cada dia de atraso no início das obras de reparo suso mencionadas.
Em prol de sua pretensão, narra o órgão ministerial, em síntese, que, a fim de dar cumprimento ao PAR - Programa de Arrendamento Residencial, o qual é gerido pela CAIXA e destinado à população de baixa renda, tal demandada contratou com a ré CONNÍVEL CONSTRUÇÕES a construção e aquisição integral do Condomínio Residencial Sampaio Correia, situado no bairro de Dix-Sept Rosado, nesta Capital.
Concluído o empreendimento, a CAIXA arrendou suas unidades habitacionais a 160 famílias, mediante a assinatura de um contrato de adesão e de um termo de recebimento e aceitação. Para a regulamentação do Condomínio, foi criado um regimento interno e, para a sua administração, contratada a empresa ABREU IMÓVEIS LTDA., nomeando-se síndico, tudo sem qualquer participação dos arrendatários.
Segundo o parquet, várias irregularidades foram verificadas no contrato de adesão travado entre a CAIXA e os arrendatários, que são, em última instância, consumidores dos serviços prestados por tal empresa pública.
Primeiramente, da leitura do contrato referido, observa o representante do MPF que este foi desnaturado como contrato de arrendamento residencial, haja vista a inexistência de saldo residual a ser pago ao final do adimplemento das prestações, em caso da opção pela compra do bem arrendado. Isso porque o valor do bem arrendado foi declarado como sendo R$ 19.144,41 (dezenove mil, cento e quarenta e quatro reais e quarenta e um centavos), ficando estipulado o valor da taxa mensal de arrendamento em R$ 134,01 (cento e trinta e quatro reais e um centavo) e o prazo do arrendamento, em 180 meses. Desse modo, e tendo ainda em vista que o índice de correção monetária da taxa mensal é superior àquele aplicado ao valor do imóvel, ao final do prazo do contrato, ter-se-á pago valor maior do que o do imóvel, o que configura uma compra e venda à prestação, e não contrato de arrendamento residencial. Em face disso, pugna o órgão ministerial pela harmonização das cláusulas 4ª, 6ª e 9ª do contrato em comento, mediante a redução do prazo do arrendamento para 143 meses, de forma que, ao final deste, reste saldo residual a ser pago pelo arrendatário, caso opte por comprar o bem objeto do arrendamento.
Na seqüência, o representante do parquet aponta a abusividade das cláusulas 20ª, a; 21ª, parágrafo único; e 22ª do contrato de adesão em testilha, por impossibilitarem a responsabilidade do fornecedor por vícios no imóvel arrendado; estabelecer a obrigação de o consumidor reparar quaisquer vícios verificados no imóvel, segundo as determinações do fornecedor; e negar-lhe o direito de indenização por benfeitorias de qualquer natureza, como também o correlato direito de retenção.
Aduz, ainda, o órgão ministerial a nulidade da cláusula 7ª do contrato em comento, que exige a contratação de seguro de vida à CAIXA durante o contrato de arrendamento residencial, sob argumento de que viola o art. 39, I, do CDC; da cláusula 14ª, que não define o índice a ser utilizado para correção monetária na hipótese de impontualidade do pagamento, ficando a fixação deste ao talante do fornecedor; da cláusula 5ª, que não especifica quais despesas condominiais estão incluídas na expressão "taxas de condomínio", as quais, segundo tal item do contrato, são de responsabilidade dos arrendatários, que, não sendo compradores do imóvel, não devem arcar com o adimplemento de despesas extraordinárias; da cláusula 16ª, que prevê a possibilidade de substituição do imóvel arrendado, disciplinando que, caso o imóvel substituído seja de valor superior ao substituto, o arrendatário não fará jus à diferença de preço verificada, mas, ao contrário, se o imóvel substituto for de valor superior ao substituído, o arrendatário deverá pagar à CAIXA o valor da diferença apurada; das cláusulas 19ª, II, b, e 24ª, que estipulam a cobrança de honorários de 20% sobre o valor do débito em favor do advogado da CAIXA, na hipótese de execução extrajudicial do bem, a par do dever de pagamento dos honorários do advogado do próprio arrendatário e dos honorários sucumbenciais, em caso de perda da demanda; da cláusula 19ª, que veda novo acesso ao PAR àqueles que tiverem seus contratos rescindidos por inadimplemento contratual e que prevê a resolução do contrato de pleno direito, em caso de inadimplemento, ou seja, sem ofertar ao arrendatário a faculdade de purgar a mora; da cláusula 15ª, parágrafos 5º e 7º, que prevêem a possibilidade de saldo residual negativo, impensável em um contrato de arrendamento residencial, bem como veda a possibilidade de devolução de eventual valor residual adiantado durante a vigência do arrendamento residencial, na hipótese de o arrendatário, ao final do prazo estipulado, optar por devolver o bem arrendado, e não por comprá-lo, ainda que se trate de indenização devida por benfeitorias; e das cláusulas 17ª, 18ª e 19ª, as quais estipulam que, rescindido o contrato por desistência, inadimplemento ou ilícito contratual, as prestações já pagas serão apropriadas como taxa de ocupação, não cabendo qualquer devolução ao arrendatário, ainda que a título de indenização por benfeitorias.
Ademais, argúi o parquet federal a violação ao disposto no art. 54, §§ 3º e 4º, da legislação consumerista, asseverando que o contrato de adesão travado entre partes não foi escrito com caracteres legíveis, a fim de facilitar a compreensão do consumidor, deixando-se igualmente de se destacar as cláusulas que implicam limitações dos direitos dos arrendatários.
Por outro lado, ressalta o representante do MPF a existência de sérios vícios construtivos nas unidades do Residencial Sampaio Correia, tais como vazamentos, inclusive de caixas de gordura, infiltrações, rachaduras em pisos, paredes e tetos, ralos desnivelados, portas e janelas emperradas, ausência de registro de gás, entre outros, conforme provas produzidas nos autos em apenso à inicial, justificando a responsabilidade da CAIXA, como gestora do PAR, e da CONNÍVEL, como construtora do Residencial, pelos mesmos.
Por fim, argumenta o órgão ministerial que, em face do caráter sui generis do contrato sob estudo, onde os consumidores não se posicionam como locadores, compradores ou promitentes compradores, advêm várias dificuldades na administração do Condomínio. De fato, a CAIXA, como proprietária dos imóveis arrendados, tomou para si a responsabilidade pela administração do Residencial e, como não tem interesse na prestação desse serviço nem funcionários disponíveis para tal, contratou a empresa ABREU IMÓVEIS para fazê-lo, sem qualquer interferência dos arrendatários, principais interessados na administração do Condomínio. Resultado desse agir foram contas de energia elétrica de um dos blocos em atraso, sujeitando as unidades habitacionais respectivas à corte de energia, quando havia recursos na conta do condomínio suficientes à quitação de tais obrigações.
Além disso, ficou estipulado no contrato travado entre a CAIXA e a ABREU IMÓVEIS que a remuneração desta seria proporcional às despesas efetuadas pelo Condomínio, o que, segundo os arrendatários, estimula a ré ABREU IMÓVEIS a aumentar os encargos condominiais, a fim de aumentar sua contra-partida. Exemplo disso foi que, em um ano, a taxa de condomínio aumentou 50% e a remuneração da empresa administradora do condomínio aumentou em 100%, tudo sem consentimento ou consulta aos arrendatários.
Destarte, propõe o parquet, para solução do impasse, a equiparação dos arrendatários aos promitentes compradores, a fim de que sejam investidos nos direitos reconhecidos a estes, inclusive exercício das funções normativas e administrativas do Condomínio.
À inicial foram acostados os documentos às fls. 38/56, fazendo-se ainda referência àqueles que formam o ANEXO 1 à Ação Civil Pública nº 2003.84.00.009988-3, ajuizada anteriormente com o mesmo objeto e extinta sem julgamento do mérito.
Com vista para se manifestar acerca do pedido de antecipação de tutela, a ré ABREU IMÓVEIS pronunciou-se às fls. 72/92 e 94/95, requerendo o indeferimento de tal pleito, sob alegação de inexistência de prova inequívoca a demonstrar a verossimilhança das alegações expostas na exordial, a legalidade e regular execução do contrato celebrado entre si e a CAIXA, bem como a ausência de demonstração de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
A CAIXA, por sua vez, alegou, às fls. 97/104, sua ilegitimidade para responder ao pedido de realização de reparos no Condomínio Residencial Sampaio Correia, vez que não foi responsável por sua construção, atuando apenas como gestora do PAR. Aduziu, ademais, que, na condição de proprietária fiduciária dos imóveis arrendados, deve permanecer com o direito de administrá-los, o que vem sendo feito através da ABREU IMÓVEIS, empresa especializada nessa modalidade de serviço. Por fim, argumentou a existência de periculum in mora inverso, a justificar a denegação da antecipação de tutela pretendida, haja vista que, atendido o pleito do autor, a CAIXA ver-se-ia privada de administrar bem que lhe pertence, limitando-se a observar a sua depreciação pela gestão de quem legalmente tem somente a sua posse precária.
Em decisão às fls. 109/118, o MM. Juiz então presidente do feito determinou a emenda da inicial, para esclarecimento dos fatos e pedidos ali apresentados. Em resposta, o representante do MPF manifestou-se às fls. 120/123, afirmando, dentre outros fatos, que pretende ver os contratos referidos na exordial tratados verdadeiramente como contratos de arrendamento residencial, sendo necessário, para tanto, a anulação de algumas de suas cláusulas e a reinscrição de outras. Nesse sentido, afirmou a imprescindibilidade de declaração da nulidade das cláusulas 20ª, a; 21ª, IV e parágrafo único; 22ª; 7ª, §§ 3º e 4º; 16ª, §§ 2º e 3º; 19ª, inclusive itens II e III e parágrafo primeiro; 24ª; 15ª; 17ª; 18ª, pelas razões já explicitadas na inaugural. De outra banda, merecem apenas ajustes, a fim de adaptar o contrato à sua função social, as cláusulas de nºs. 14; 5; e 16, §§ 2º e 3º.
Em decisão às fls. 125/129, o MM. Juiz deferiu a antecipação de tutela pleiteada, determinando que, no prazo de 30 dais, sob pena de multa diária, a CONSTRUTORA CONNÍVEL iniciasse, às suas expensas, as obras necessárias ao pleno aproveitamento das unidades habitacionais que compõem o Condomínio Residencial Sampaio Correia, especialmente o conserto dos defeitos elétricos, dos esgotos e vazamento no reservatório de água, ficando a CAIXA obrigada a fiscalizar a execução e a qualidade das obras. Ademais, na respeitável decisão, facultou-se aos moradores do referido Condomínio, mediante Assembléia Geral, escolher o seu síndico, afastando-se a ABREU IMÓVEIS da administração do Residencial, caso fosse esta a vontade da maioria.
À fl. 135, a construtora ré comunicou ao Juízo a interposição de Agravo por Instrumento da decisão suso mencionada, acostando aos autos a cópia da peça recursal, assim como a CAIXA acostou às fls. 232 e seguintes o comunicado de sua irresignação com a mesma decisão e a cópia do recurso que interpôs.
À fl. 328 o Juízo a quo manteve a decisão proferida pelos seus próprios fundamentos e, às fls. 330/334, juntou-se cópia da decisão proferida pelo douto Desembargador Federal Marcelo Navarro nos autos do Agravo por Instrumento interposto pela CAIXA, na qual deferiu parcialmente o pedido de atribuição de efeito suspensivo à decisão vergastada, suspendendo apenas a alínea b do decisum de primeiro grau.
Às fls. 359/398, o representante do MPF requereu a juntada aos autos de novas perícias realizadas pelo CREA e pelo INCRA no Residencial em comento, em face de solicitação da ATMIPAR/RN - Associação dos Titulares e dos Moradores dos Imóveis do Programa de Arrendamento Residencial do Estado do Rio Grande do Norte.
Às fls. 402/414, a empresa CONNÍVEL ofertou sua contestação, requerendo a improcedência do pleito autoral, sob o argumento de que a CAIXA fiscalizou a obra de construção do Residencial em debate, pois tal proceder era necessário à liberação dos recursos que financiaram o empreendimento, tendo a construtora utilizado materiais compatíveis com aqueles exigidos por tal empresa pública, de sorte que não merece prosperar a afirmação do órgão ministerial de que a obra foi mal executada.
Alegou, ainda, que o representante do parquet desvirtuou as conclusões do laudo do CREA que embasaram a decisão liminar proferida nos autos, asseverando, ademais, que as avarias verificadas nas unidades habitacionais do Residencial são condizentes com o seu tempo de uso e/ou mau uso, ressaltando que os problemas hidro-sanitários, causados por fatores externos, já foram solucionados, de sorte que o pleito referente a este reparo se encontra prejudicado.
Afirmou igualmente que também foram reparados vícios de construção em alguns apartamentos, inclusive os decorrentes do mau uso do prédio pelos moradores e os elétricos. Quanto às instalações elétricas, salientou ainda a CONNÍVEL que as mesmas foram vistoriadas e aprovadas pela COSERN.
À fl. 415 foi certificado que a ABREU IMÓVEIS deixou transcorrer in albis o prazo para contestação.
Às fls. 416/435, o órgão ministerial acostou aos autos requerimento da ATMIPAR /RN, relativo aos defeitos apresentados nas unidades habitacionais componentes do Residencial Sampaio Correia.
Às fls. 437/465, a CAIXA, tempestivamente, apresentou sua defesa, requerendo a improcedência do pleito inicial, sob alegação de que não lhe competia a fiscalização da qualidade da obra empreendida pela construtora CONNÍVEL, mas apenas verificar o regular andamento da obra, ou seja, o cumprimento do cronograma físico-financeiro previsto para liberação das parcelas dos recursos. Argumentou, ainda, que o empreendimento foi analisado e aprovado pelos órgãos públicos competentes, não havendo que se falar em responsabilidade da CAIXA por vícios de construção.
Ademais, quanto à natureza do contrato travado entre a empresa pública e os moradores do Residencial em comento, alertou a CAIXA tratar-se de contrato de arrendamento residencial, que é diverso do compromisso de compra e venda, razão pela qual os arrendatários não podem ser equiparados a promitentes-compradores. Ao contrário, assemelham-se mais a locadores, já que apenas detêm a posse dos bens, mas não sua propriedade, que remanesce com a arrendadora.
Nesse pórtico, ressaltou a contestante que o fato de inexistir valor residual a ser pago ao final do prazo do contrato, na espécie, não descaracteriza a avença como arrendamento residencial, como vem entendendo atualmente o Superior Tribunal de Justiça, mormente após o cancelamento da Súmula nº 263, que embasa o pedido inicial. Aliás, o pagamento antecipado do saldo residual apenas favorece os arrendatários.
No que pertine à alegação de que a imposição de contratação de seguro de vida pelos arrendatários implica em venda casada, asseverou a CAIXA que, dentro das atribuições que lhe foram conferidas pela legislação que rege o PAR, a empresa pública definiu as diretrizes dos contratos de arrendamento residencial, estabelecendo tal cláusula em benefício do arrendatário, a fim de que a família deste seja acobertada pelo seguro em hipótese de falecimento do titular do contrato. Além disso, afirmou que a parcela da prestação mensal equivalente ao prêmio do seguro é ínfima.
Argüiu, outrossim, que a cláusula 14ª traz sim previsão expressa do índice de correção a ser aplicado à prestação mensal em caso de impontualidade no pagamento e que não há abusividade na cláusula que prevê o pagamento, pelo arrendatário, das taxas de condomínio.
No tocante à clausula que disciplina as regras para substituição do imóvel, aduziu a CAIXA a sua regularidade, afirmando que eventual valor pago a maior deve ser revertido em favor do FAR - Fundo de Arrendamento Residencial.
Igualmente defendeu a contestante a regularidade da cláusula que prevê o ônus do arrendatário de custear honorários advocatícios de 20% sobre o valor do débito em caso de execução extrajudicial proposta pela CAIXA, afirmando inexistir lei que proíba tal procedimento.
No mesmo passo, asseverou a CAIXA a regularidade e justiça da cláusula que prevê a impossibilidade de o arrendatário inadimplente voltar a participar do PAR, bem como da cláusula que prevê a perda total das prestações pagas em favor do FAR, no caso de resolução do contrato, tomando-se tais prestações como taxa de ocupação.
Quanto à alegação ministerial de que o contrato em debate não prevê a possibilidade de purgação da mora, sustentou a CAIXA a inveracidade da afirmação, apontando o teor do inciso I da cláusula 19ª.
No concernente à alegação de ofensa aos §§ 3º e 4º do art. 54 do CDC, afirmou a empresa pública federal sua impertinência, pois o contrato em testilha, embora caracterizado como de adesão, foi inscrito de forma clara e com letras de tamanho padrão, destacando-se ainda a palavra "arrendatário" toda vez que utilizada no instrumento.
Por fim, no atinente ao pleito do MPF de que os arrendatários sejam os administradores do Condomínio, asseverou a CAIXA a regularidade de seu contrato com a ABREU IMÓVEIS, firmado após o devido processo licitatório, defendendo ainda que tem direito à administração dos imóveis, já que lhe pertencem enquanto em curso o prazo do contrato de arrendamento.
Às fls. 466/469 e 470/484, o representante do parquet requereu a juntada aos autos de documentos que comprovam uma grave situação de incêndio em uma das unidades habitacionais do Condomínio em apreço, assim como relacionam defeitos de construção que ainda persistem, nos termos de pareceres técnicos.
Às fls. 485/491, o órgão ministerial informou o Juízo do descumprimento da antecipação de tutela deferida, requerendo que, em face da desídia da CONNÍVEL, fosse determinado à CAIXA, na condição de responsável solidária e às suas expensas, o início das obras de reforma necessárias ao pleno aproveitamento das unidades habitacionais do Residencial Sampaio Correia, especialmente os reparos dos vazamentos e infiltrações do telhado, das fissuras internas e da caixa d'água, sob pena de multa diária. Pleiteou ainda pelo arbitramento do prazo de 30 dias para execução do serviço e de 60 dias para que a CAIXA comprovasse sua realização, com as devidas explicações.
Através da decisão prolatada às fls. 493/499, o requerimento foi atendido.
Às fls. 503/515, a CAIXA informou ao Juízo a interposição de Agravo por Instrumento da decisão proferida às fls. 493/499, juntando aos autos cópia da peça recursal e requerendo o exercício do juízo de retratação. Exercido este, foi mantida a decisão por seus próprios fundamentos, conforme despacho à fl. 516.
Às fls. 518/536, a CAIXA comunicou ao Juízo o início do cumprimento da liminar deferida, acostando aos autos cópia de contrato firmado para esse fim.
Instadas a se manifestar sobre os documentos novos acostados pelo parquet aos autos, a CONNÍVEL pronunciou-se às fls. 539/541, refutando as alegações dos moradores do Residencial em comento, enquanto a ABREU IMÓVEIS manteve-se inerte, conforme certidão à fl. 542.
À fl. 543 foi determinada a realização de vistoria no Condomínio em apreço para averiguação do cumprimento da liminar deferida nos autos, sendo o laudo respectivo acostado às fls. 544/556.
Designada audiência de conciliação, fizeram-se presentes ao ato todas as partes, explicando a CAIXA e a CONNÍVEL os motivos pelos quais não deram, até aquele momento, cumprimento à liminar deferida nos autos. Em face de tais argumentos, o MM. Juiz que presidia o ato determinou a expedição de ofício ao FAR - Fundo de Arrendamento Residencial, a fim de que fossem liberados, no prazo de 10 dias, os recursos necessários à realização das reformas determinadas nos autos, ficando ainda a CAIXA com o encargo de implementá-las no prazo de 60 dias, inclusive contratando construtora com dispensa do procedimento licitatório. Já a empresa CONNÍVEL foi instada a realizar perícia na unidade habitacional que apresentou problemas elétricos, a fim de demonstrar que tais vícios foram sanados (fls. 563/567).
À fl. 569 a CAIXA informou a interposição de Agravo por Instrumento da decisão proferida em audiência e, às fls. 570/589, foram acostados aos autos documentos enviados pelo Ministério das Cidades, outrora oficiado em face do decisum prolatado naquele ato.
Em decisão às fls. 593/596, foi indeferido o pedido da CAIXA de dilação de prazo para início das obras de reforma no Condomínio Sampaio Correia, determinadas por força da liminar concedida nestes autos.
À fl. 599 foi deferido o pleito da CONNÍVEL de concessão de trinta dias para realização da perícia determinada em audiência, em face da ausência de chuvas em Natal.
Às fls. 601/602, o representante do parquet requereu a nomeação de perito para acompanhar as obras de reforma realizadas pela CAIXA no Residencial em comento, a fim de atestar sua consonância com as normas técnicas.
Às fls. 603/604 foram acostadas aos autos informações acerca do improvimento do Agravo por Instrumento nº 61915-RN, interposto pela CONNÍVEL.
Às fls. 606/622, a CAIXA juntou aos autos, em face de determinação judicial, relatório de acompanhamento das obras que vinha realizando no Residencial Sampaio Correia, bem como dos recibos de pagamento emitidos pela construtora contratada para tanto.
Às fls. 625/634, a CONNÍVEL acostou aos autos o resultado da perícia que realizou em unidade habitacional do Bloco 3 do Condomínio Residencial em apreço, por força da ordem expedida na audiência de conciliação acima mencionada.
Instado a se manifestar sobre os últimos documentos acostados pela CAIXA e pela CONNÍVEL, o órgão ministerial pronunciou-se às fls. 638/639, reiterando o pleito de nomeação de perito para acompanhar a execução das obras de reforma determinadas nos autos, bem assim a realização de vistoria periódica no quadro elétrico do Bloco 3 do Condomínio em comento.
Tal pleito foi acatado à fl. 640, acostando o perito o laudo solicitado às fls. 641/648.
Às fls. 650/653, observando que a liminar deferida não restou suficientemente cumprida até aquele momento, a representante do Ministério Público pugnou pela conclusão dos autos para julgamento e fixação de prazo, na sentença, para conclusão das obras de reforma determinadas nos autos.
À fl. 656, o julgamento foi convertido em diligência para que as partes especificassem as provas que ainda pretendiam produzir e a CAIXA manifestar-se acerca do integral cumprimento da liminar deferida nos autos.
Em vista disso, o Parquet pronunciou-se às fls. 658/660, renunciando à produção das provas solicitadas anteriormente e pugnando pelo julgamento da lide, com a fixação, na sentença, de prazo para conclusão das obras iniciadas pela CAIXA. Esta, por sua vez, manifestou-se às fls. 664/665, alegando a prescindibilidade de produção de outras provas e relatando as obras que realizou no Residencial Sampaio Correia, por força da determinação exarada nestes autos.
Conforme certidão à fl. 666, a ABREU IMÓVEIS e a CONNÍVEL não se pronunciaram acerca do interesse na produção de outras provas.
Vindo-me os autos conclusos para julgamento, era o que importava relatar.


II - FUNDAMENTAÇÃO

Presentes, no caso em riste, as condições da ação e os pressupostos de existência e validade da relação jurídica processual, cabe-nos analisar o mérito da controvérsia posta à apreciação.


II.1 - DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Inicialmente, observo ser aplicável o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990) aos contratos de arrendamento residencial travados entre a CAIXA e os adquirentes das unidades habitacionais do Condomínio Residencial Sampaio Correia. É que, na hipótese, encontra-se plenamente configurada uma relação de consumo, consubstanciada na presença do arrendatário como consumidor, já que destinatário final do serviço bancário, e do agente financeiro, que presta aquele, como fornecedor.
Nesse passo, cumpre relevar que a questão já restou decidida pelo Supremo Tribunal Federal que, no julgamento da ADIn nº 2591, entendeu serem aplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor às relações travadas entre as instituições bancárias e seus clientes.
Desse modo, não se pode olvidar da aplicação, in casu, dos dispositivos da legislação consumerista que pregam o princípio da boa-fé objetiva, entre outros, bem como da possibilidade de resolução judicial da avença ou de sua revisão, na hipótese de verificação de cláusulas consideradas abusivas.


II.2 - DAS NULIDADES DOS CONTRATOS DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL TRAVADOS ENTRE A CAIXA E OS MORADORES DO CONDOMÍNIO RESIDENCIAL SAMPAIO CORREIA

Como ressaltado alhures, o representante do MPF, na inicial, alegou a nulidade de diversas cláusulas do contrato de arrendamento residencial travado entre a CAIXA e cada um dos adquirentes de unidades habitacionais do Residencial Sampaio Correia (ver cópia da avença às fls. 443/447 dos autos em apenso), afirmando que várias delas mereciam ser reconhecidas como tal e afastadas do contrato, enquanto outras deveriam ser reinscritas.
A fim de melhor analisar cada nulidade argüida, passaremos a estudá-las separadamente.
Antes, contudo, é de mister assentar que, na interpretação de tais cláusulas, além de considerar as normas consumeristas, é essencial se ter em mente a finalidade do programa a que aderiram os consumidores representados pelo parquet, ao travar com a CAIXA o contrato de arrendamento residencial impugnado.
De fato, não se pode olvidar que o Programa de Arrendamento Residencial, instituído pela Lei nº 10.188, de 12 de fevereiro de 2001, e gerido pela CAIXA, tem por escopo o atendimento à necessidade de moradia da população de baixa renda, devendo essa nobre finalidade, que, inclusive, atende a preceito constitucional (art. 6º da Carta da República), nortear a interpretação das cláusulas contratuais contestadas pelo órgão ministerial, a fim de que a prestação jurisdicional solicitada não venha a inviabilizar a execução do programa.


II.2.1 - Cláusulas 4ª, 6ª, 9ª e 15ª, parágrafos 5º e 7º.

Ao impugnar diversas das cláusulas do contrato travado entre a CAIXA e os adquirentes das unidades habitacionais do Condomínio Residencial Sampaio Correia, o representante do parquet principiou por questionar as de nº 04, 06 e 09, afirmando ser necessária sua harmonização, a fim de restaurar a natureza da avença. Isso porque, a seu ver, o pagamento antecipado de todo o valor residual desqualifica-a como contrato de arrendamento residencial, na medida em que este pressupõe, necessariamente, a existência de um preço previamente fixado a ser pago ao final da avença, na hipótese de opção pela compra do bem.
Mais à frente, impugnou, igualmente, o órgão ministerial, os termos da cláusula 15ª, §§ 5º e 7º, que prevêem a possibilidade de saldo residual negativo, vedando ainda a possibilidade de devolução de eventual valor residual adiantado durante a vigência do arrendamento residencial, caso o arrendatário, ao final do prazo estipulado, opte por devolver o bem arrendado, e não por comprá-lo, ainda que se trate de indenização devida por benfeitorias.
Vejamos, inicialmente, o que dispõem as cláusulas aludidas:

"CLÁUSULA QUARTA - DO VALOR E DO REAJUSTE DO BEM ARRENDADO - O valor atual do imóvel é de R$ 19.144,41 (dezenove mil, cento e quarenta e quatro reais e quarenta e um centavos) e será reajustado anualmente, na data de aniversário do contrato, mediante a aplicação de 80% (oitenta por cento) do índice de atualização aplicado às contas vinculadas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, acumulado nos últimos 12 (doze) meses ou o índice que vier a substituí-lo.".

"CLÁUSULA SEXTA - DO VALOR E DO REAJUSTE DA TAXA DE ARRENDAMENTO MENSAL - A título de taxa de arrendamento, os ARRENDATÁRIOS pagarão à ARRENDADORA o valor mensal de R$ 134,01 (cento e trinta e quatro reais e um centavo), que será reajustado anualmente, na data de aniversário do contrato, mediante a aplicação do índice de atualização aplicado às contas vinculadas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, acumulado nos últimos 12 (doze) meses ou o índice que vier a substituí-lo.".

"CLÁUSULA NONA - DO PRAZO DO CONTRATO DE ARRENDAMENTO - O prazo do presente contrato é de 180 (cento e oitenta) meses, contados da data da sua assinatura.".

"CLÁUSULA DÉCIMA QUINTA - DA OPÇÃO DOS ARRENDATÁRIOS - Findo o prazo previsto na cláusula nona, com o integral cumprimento das obrigações pactuadas no presente instrumento, fica consolidado o direito dos ARRENDATÁRIOS de optar:

a) pela compra do bem arrendado, mediante o pagamento do valor residual, se houver, devidamente atualizado na forma deste contrato; ou
b) pela renovação do contrato de arrendamento; ou, ainda,
c) pela devolução do bem arrendado.

PARÁGRAFO PRIMEIRO - Para o exercício de qualquer das opções elencadas no caput desta cláusula, após cumpridas todas as obrigações contratuais, os ARRENDATÁRIOS deverão comunicar sua pretensão à ARRENDADORA ou a quem esta indicar, até 30 (trinta) dias antes do término do prazo contratual.

PARÁGRAFO SEGUNDO - Para o exercício da opção de compra do bem, será exigido dos ARRENDATÁRIOS, após vencido o prazo do arrendamento com o integral cumprimento das obrigações ora assumidas, o pagamento do valor residual devido, se houver, devidamente atualizado.

PARÁGRAFO TERCEIRO - O valor residual de que trata esta cláusula, será pago em parcela única pelos ARRENDATÁRIOS, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, e equivalerá à diferença entre o valor atualizado, na forma deste contrato, do bem arrendado e o somatório das taxas de arrendamento atualizadas contratualmente efetivamente pagas durante a vigência do contrato, que nestas condições e a partir da formalização da opção de compra, passará a compor o preço de aquisição do bem.

(...)

PARÁGRAFO QUINTO - Caso o cálculo do valor residual efetuado na forma do parágrafo terceiro desta cláusula resulte em valor negativo, a diferença assim obtida será tratada como efetivo pagamento da taxa de arrendamento do imóvel, ficando a ARRENDADORA obrigada a outorgar, em favor dos ARRENDATÁRIOS, a competente escritura definitiva de compra e venda, a qual será levada a registro, perante o Cartório de Registro de Imóveis competente, não cabendo a estes qualquer direito à restituição da diferença apurada.

(...)

PARÁGRAFO SÉTIMO - Optando pela devolução do bem arrendado, ao término do prazo do arrendamento ora contratado, os ARRENDATÁRIOS deverão restituí-lo no mesmo estado de conservação e habitabilidade recebido, salvo desgaste natural, na data de vencimento do contrato, sob pena de caracterização de esbulho possessório que autoriza a adoção de procedimentos judiciais cabíveis, não sendo devida qualquer devolução de valores pagos, inclusive quanto as benfeitorias realizadas.".

Diante dessas prescrições, sustentou o órgão ministerial que, na hipótese, inexiste saldo residual a ser pago ao final do adimplemento das prestações, em caso da opção pela compra do bem arrendado, haja vista o valor deste ter sido declarado como sendo R$ 19.144,41 (dezenove mil, cento e quarenta e quatro reais e quarenta e um centavos), bem como ter sido estipulado o valor da taxa mensal de arrendamento em R$ 134,01 (cento e trinta e quatro reais e um centavo) e fixado o prazo do arrendamento em 180 meses.
Desse modo, e tendo também em vista que o índice de correção monetária da taxa mensal é superior àquele aplicado ao valor do imóvel (cláusulas 4ª e 6ª), ao final do prazo do contrato ter-se-á pago valor maior do que o do imóvel, o que configura uma compra e venda à prestação, e não contrato de arrendamento residencial.
Ainda segundo o parquet, o disposto na cláusula 15ª, parágrafo 5º, reforça essa convicção, eis que ali se encontra estabelecida a possibilidade de, ao final dos contratos em testilha, apurar-se saldo residual negativo, o que é impensável em um contrato de arrendamento mercantil ou residencial. Além disso, a apuração de saldo residual negativo, in casu, confirma que será pago valor maior do que o imóvel que se está a adquirir, transformando os arrendatários em credores da instituição financeira e impondo que esta restitua àqueles tal diferença.
Nessa mesma esteira, igualmente para comprovar a desnaturação do contrato de arrendamento residencial, apontou o órgão ministerial o prescrito na cláusula 15ª, parágrafo 7º, no sentido de que, mesmo optando o arrendatário, ao término do prazo estipulado para o contrato, pela devolução do bem, não terá direito à devolução de valores pagos, onde se inclui eventual saldo residual adiantado. A seu ver, nesse item contratual, a CAIXA rompeu com o equilíbrio da avença, postando-se em situação de extrema vantagem relativamente aos arrendatários, e incidiu no disposto na Portaria nº 03, de 19 de março de 1999, da Secretaria de Direito Econômico, que dispõe serem nulas de pleno direito as cláusulas que "Estabeleçam, em contrato de arrendamento mercantil (leasing), a exigência do pagamento antecipado do Valor Residual Garantido (VRG), sem previsão de devolução desse montante, corrigido monetariamente, se não exercida a opção de compra do bem".
Para fundamentar juridicamente essas alegações, o representante do MPF invocou a Lei nº 6.099, de 12 de setembro de 1974, e o enunciado nº 263 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual "A cobrança antecipada do valor residual (VRG) descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil, transformando-o em compra e venda à prestação.".
A CAIXA, por sua vez, alegou em sua defesa que a Súmula do STJ invocada pelo órgão ministerial trata do arrendamento mercantil, e não do arrendamento residencial, sendo inaplicável a este. Além disso, referido enunciado foi cancelado em 10 de setembro de 2003.
De outro lado, argüiu a empresa pública que o pagamento antecipado do valor residual, in casu, não prejudica, mas beneficia os arrendatários, vez que não precisarão desembolsar, ao final das prestações e de uma só vez, o valor fixado para a opção de compra do imóvel.
Ademais, segundo a CAIXA, o ínfimo valor pago a maior pelos arrendatários, ao fim do contrato, conforme apontado pelo representante do MPF, serve para a empresa pública custear a administração dos contratos do PAR, existindo previsão legal para tanto (art. 3º, § 3º, da Lei nº 10.188/2001).
Quanto à possibilidade de saldo residual negativo, a empresa pública sustentou que o fato encontra respaldo no art. 7º, inciso IV, da Lei nº 10.188/2001, repisando que a apuração negativa beneficia os beneficiários do PAR, que não teriam condições financeiras de desembolsar o valor residual de uma só vez, caso fosse assim exigido, ressaltando, outrossim, que "O sistema de arrendamento residencial foi, então, projetado para facilitar a aquisição final dos imóveis, sendo esse o escopo do Programa."
Já no atinente ao disposto no § 7º dessa última cláusula, deixou a CAIXA de contestar expressamente as alegações do parquet.
Analisando com vagar os argumentos das partes, observo primeiramente que não merece prosperar a afirmação do órgão ministerial no sentido de que, como atualmente redigido, o contrato em testilha encontra-se desnaturado, não configurando contrato de arrendamento residencial, mas sim de compra e venda a prazo. Isso porque tenho como plenamente possível a antecipação do pagamento do valor residual no contrato de arrendamento mercantil ou residencial, seguindo, nesse aspecto, a jurisprudência atual das nossas cortes superiores a respeito do leasing.
Com efeito, como bem aduzido pela CAIXA, não mais encontra guarida na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça o enunciado nº 263, que foi cancelado e substituído pelo enunciado nº 293, que prescreve: "A cobrança antecipada do valor residual garantido (VRG) não descaracteriza o contrato de arrendamento mercantil.".
Tal jurisprudência é plenamente aplicável ao presente caso, haja vista o disposto no art. 10 da lei de regência do PAR (Lei nº 10.188/2001), no sentido da aplicação subsidiária da legislação que rege o leasing ao contrato em comento, o que permite fazer incidir sobre o mesmo também o entendimento dos tribunais acerca daquela modalidade de avença.
Ainda acerca da jurisprudência do Colendo STJ, é de se destacar que, nos precedentes que ensejaram a aprovação do novo enunciado, os Ministros daquela Corte chegaram à conclusão de que, não havendo óbice legal ao pagamento antecipado do valor residual, não há que se falar em nulidade da cláusula que o prevê.
Outrossim, assentaram que tal pagamento antecipado não assemelha o contrato de arrendamento mercantil ao contrato de compra e venda à prestação, pois, no primeiro, além da opção de compra do bem ao final do prazo estipulado para a vigência do acordo, há ainda as opções de devolução do mesmo ou de prorrogação do contrato, hipóteses inexistentes na segunda modalidade de contrato mencionada.
Por fim, registraram os augustos ministros que a previsão do pagamento antecipado nem sempre onera o arrendatário, ao contrário, por vezes visa a beneficiá-lo, facilitando-lhe a aquisição final do bem, não havendo vedação a que o valor residual seja fixado em montante simbólico, a critério das partes contratantes.1
É verdade que, no caso presente, para o valor residual não foi fixado um valor ínfimo, mas um valor negativo, como demonstrado pelo parquet. Todavia, essa circunstância não nos leva à conclusão de que a avença em análise não se caracteriza como contrato de arrendamento residencial, sendo possível, e pertinente, a interpretação de que, na hipótese, a existência de saldo residual negativo significa que o valor residual foi integralmente antecipado, correspondendo à diferença apurada nos termos do parágrafo 3ª da cláusula 15ª.
Veja-se que tal pagamento antecipado se justifica pela finalidade precípua do PAR, que é a aquisição da casa própria pela população de baixa renda, como referido alhures pelo ente paraestatal.
Assim, exemplificando a hipótese dos autos, temos que, levando-se em consideração os montantes inicialmente previstos no contrato como valor do bem imóvel arrendado (R$ 19.144,41) e da denominada taxa de arrendamento (R$ 134,01), a qual deve ser paga por 180 meses antes de o arrendatário optar pela compra do imóvel, sua devolução ou a renovação do ajuste, o saldo residual verificado, nos termos do pré-falado parágrafo 3º da cláusula 15ª, seria de -R$ 4.977,39 (quatro mil, novecentos e setenta e sete reais e trinta e nove centavos negativos).
O valor negativo, como acima aludido, se explica pelo fato de já ter sido o valor residual integralmente antecipado durante o prazo estipulado para o contrato, visando facilitar ao arrendatário a aquisição do bem.
Nesses moldes, vê-se que se mostra prescindível a alteração das cláusulas 4ª, 6ª ou 9ª do contrato para que o mesmo se caracterize como contrato de arrendamento residencial, na medida em que o mesmo já conta com previsão de valor residual garantido a ser pago pelo arrendatário que opta pela aquisição do bem ao fim da avença.
Sendo assim, tenho que o adiantamento do valor residual garantido, ainda que integral, implicando em saldo residual negativo, não desnatura o contrato de arrendamento residencial em apreço, mas, ao reverso, beneficia os arrendatários, ao permitir a aquisição do bem, ao final do prazo estipulado na avença, sem a necessidade de desembolso de qualquer valor adicional. Reforça minha convicção a certeza de que, como aduzido pela CAIXA, o escopo do PAR é a efetiva aquisição da casa própria, pela população de baixa renda, por meio menos oneroso, sendo remota a hipótese de opção pela devolução do bem ou renovação do contrato, embora sejam tais situações possíveis.
No entanto, interpretando-se a avença nesses termos, parece-me necessária a modificação do parágrafo 5º da cláusula 15ª, para registrar-se que, apurado saldo residual negativo, tal valor é para ser tido como valor residual garantido pago antecipadamente, e não como efetivo pagamento de taxa de arrendamento, como ali se encontra assentado.
Tal modificação mostra-se, a meu sentir, essencial, seja para demonstrar a efetiva existência de valor residual na avença, seja para permitir que, ao arrendatário que, ao final do contrato, cumpridas todas as suas obrigações, opte por devolver o bem, seja reembolsado o valor residual que adiantou à arrendadora durante o cumprimento da avença.
De fato, não se pode conceber a prevalência da previsão contratual inserta no parágrafo 7º da cláusula 15ª, no sentido de que, optando o arrendatário pela devolução do bem, não terá direito à devolução de qualquer valor pago, ainda que a título de benfeitorias. É que tal previsão contratual é nula de pleno direito, nos termos do art. 51, IV e XVI, do Código de Defesa do Consumidor, por estabelecer obrigação que coloca o arrendatário em desvantagem exagerada, restringindo-lhe direito ou obrigação fundamental inerente à natureza do contrato, além de possibilitar a renúncia ao direito de indenização por benfeitorias necessárias.
Ademais, como mencionado pelo representante do MPF, a previsão contratual de não devolução ao arrendatário do valor residual garantido que adiantou durante o prazo do arrendamento, caso opte pela devolução do bem ao final da avença, já foi listada pela Secretaria de Direito Econômico, órgão do Ministério da Justiça, como prática contratual abusiva.
Portanto, tratando-se de cláusula abusiva, é nula de pleno direito, sendo cabível sua revisão, nos moldes da legislação consumerista, a fim de que seja garantida ao arrendatário a devolução do valor residual pago antecipadamente, bem assim o pagamento de indenização em face de benfeitorias necessárias realizadas no imóvel.
Assim, na hipótese concreta, optando um dos adquirentes das unidades habitacionais que compõem o Condomínio Residencial Sampaio Correia por devolver o imóvel ao fim dos 180 meses estipulados para vigência do contrato de arrendamento residencial que travou com a CAIXA, deverá receber da arrendadora o valor residual garantido que adiantou, representado pelo valor positivo do quantum apurado no termos da cláusula 15ª, parágrafo 3º, do contrato.
Utilizando, para exemplificar a situação, o cálculo realizado acima, em que o saldo residual apurado foi negativo, no montante de R$ 4.997,39 (quatro mil, novecentos e noventa e sete reais e trinta e nove centavos), na hipótese de opção do arrendatário pela devolução do bem, ser-lhe-ia devido o valor positivo de R$ 4.997,39 (quatro mil, novecentos e noventa e sete reais e trinta e nove centavos).
Assim, a meu sentir, não obstante devam permanecer inalterados os termos das cláusulas 4ª, 6ª e 9ª do contrato em apreço, merecem passar por modificações, a fim de extirpar-se da avença práticas abusivas, os parágrafos 5º e 7º da cláusula 15ª, os quais passam a contar com a seguinte redação (destaque para os trechos alterados):
"CLÁUSULA DÉCIMA QUINTA - DA OPÇÃO DOS ARRENDATÁRIOS - Findo o prazo previsto na cláusula nona, com o integral cumprimento das obrigações pactuadas no presente instrumento, fica consolidado o direito dos ARRENDATÁRIOS de optar:

a) pela compra do bem arrendado, mediante o pagamento do valor residual, se houver, devidamente atualizado na forma deste contrato; ou
b) pela renovação do contrato de arrendamento; ou, ainda,
c) pela devolução do bem arrendado.

(...)

PARÁGRAFO QUINTO - Caso o cálculo do valor residual efetuado na forma do parágrafo terceiro desta cláusula resulte em valor negativo, a diferença assim obtida será tratada como efetivo pagamento antecipado do valor residual, ficando a ARRENDADORA obrigada a outorgar, em favor dos ARRENDATÁRIOS, a competente escritura definitiva de compra e venda, a qual será levada a registro, perante o Cartório de Registro de Imóveis competente, não cabendo a estes qualquer direito à restituição da diferença apurada.

(...)

PARÁGRAFO SÉTIMO - Optando pela devolução do bem arrendado, ao término do prazo do arrendamento ora contratado, os ARRENDATÁRIOS deverão restituí-lo no mesmo estado de conservação e habitabilidade recebido, salvo desgaste natural, na data de vencimento do contrato, sob pena de caracterização de esbulho possessório que autoriza a adoção de procedimentos judiciais cabíveis, sendo-lhe devida a devolução do valor residual de que trata esta cláusula, apurado nos termos do parágrafo terceiro. Em caso de apuração de valor residual negativo, será devido ao arrendatário o montante correspondente ao valor positivo daquele apurado. Em todo caso, realizando o arrendatário benfeitoria necessária no bem, ser-lhe-á devida a indenização respectiva.".

Noutro pórtico, no concernente à alegação ministerial de nulidade da avença pelo fato de, ao final do prazo estipulado para o contrato, os arrendatários terem pago valor superior àquele inicialmente fixado para o bem, não vejo como rechaçar os argumentos tecidos pela CAIXA. É que, como asseverado pelo ente paraestatal, é necessário custear as despesas administrativas para a execução do PAR, permitindo-se o equilíbrio econômico-financeiro do programa, a fim de que possa beneficiar sempre um número maior de cidadãos de baixa renda, e, nos contratos em apreço, embora o ajuste perdure por 15 anos, não há previsão de juros a incidir nas prestações, para remuneração do capital empregado, de sorte que o FAR - Fundo de Arrendamento Residencial haveria de suprir-se de algum modo.
E mais: há de se convir que seria inconcebível a aquisição de um bem imóvel no prazo de 15 anos, sem que se pagasse R$ 1,00 (um real) a mais do que o seu verdadeiro valor, pois a aquisição de qualquer bem num prazo tão elástico traz necessariamente consigo o ônus de encarecê-lo, ônus esse mitigado para os beneficiários do PAR, em face de várias peculiaridades do programa, inclusive a não incidência de juros, como acima mencionado.
Além disso, como também ressaltado pela empresa pública, não se pode olvidar que esse valor pago a maior, que visa permitir o funcionamento equilibrado do PAR, por ser diluído nas prestações, não onera sobremaneira o arrendatário, não implicando em comprometimento de sua renda acima do razoável.
Por fim, tenho que, definitivamente, não se pode conceber que tal previsão contratual vise dar lucro à referida empresa pública, mormente pelo fato de que, nos termos da lei de regência do PAR, os recursos empregados no programa, assim como os imóveis arrendados, pertencem ao FAR, e não à CAIXA, que apenas é gestora desse fundo.
Sendo assim, a meu juízo, com o escopo de resguardar os interesses dos próprios arrendatários, não deve prosperar o pleito do parquet no sentido de que seja reduzido o prazo do arrendamento para 143 meses, de forma que, ao final de tal período, reste saldo residual a ser pago por estes, na hipótese de opção pela compra do imóvel, apresentando-se de mister, para restabelecimento da natureza do contrato de arrendamento residencial, apenas a revisão dos parágrafos 5º e 7º da cláusula 15ª, nos termos acima destacados.


II.2.2 - Cláusulas 20ª, alínea a, 21ª, parágrafo único, e 22ª.
Quanto a estas cláusulas, aduziu o órgão ministerial que, em face de sua nulidade, devem ser extirpadas dos contratos em apreço, haja vista que a 20ª, alínea a, impossibilita a responsabilidade do fornecedor por vícios no imóvel arrendado, amoldando-se à hipótese do art. 51, I, do CDC; a 21ª, parágrafo único, estabelece a obrigação de o consumidor reparar quaisquer vícios verificados no imóvel, segundo as determinações do fornecedor, colocando-o em desvantagem exagerada e, portanto, enquadrando-se na hipótese descrita no inciso IV do art. 51 da legislação consumerista; e a 22ª nega ao arrendatário o direito de indenização por benfeitorias de qualquer natureza, como também o correlato direito de retenção, subsumindo-se à previsão do inciso XVI do mesmo artigo.
Analisando cada alegação de per si, encontramos a seguinte prescrição na cláusula 20ª, ipsis litteris:

"CLÁUSULA VIGÉSIMA - DAS DECLARAÇÕES - Os ARRENDATÁRIOS declaram para todos os fins de direito que:

a) não são proprietários ou promitentes compradores de imóvel residencial no local de domicílio nem onde pretendam fixar residência;
b) não são titulares e/ou avalistas de qualquer modalidade de financiamento habitacional, em todo território nacional;
c) recebem o imóvel, a que se refere o presente contrato, em perfeitas condições de uso e conservação, comprometendo-se a providenciar, por sua conta e risco, todos os reparos e consertos necessários à manutenção de sua habitabilidade;
d) têm ciência de que o bem arrendado não poderá ser subarrendado, emprestado, cedido ou transferido;
e) têm ciência e concordam que, em caso de desistência do arrendamento, os valores por eles pagos, a título de taxa de arrendamento, serão apropriados como taxa de ocupação pelo uso do imóvel;
f) têm conhecimento das normas e obrigações que regem a convenção de condomínio, se for o caso.".

Percebe-se, de logo, da leitura da cláusula, que o representante do MPF, ao alegar sua nulidade, quis se referir à alínea c, e não à alínea a, haja vista que é naquela que a CAIXA procura se eximir da responsabilidade por qualquer vício verificado no imóvel arrendado.
De fato, é na alínea c suso transcrita que se encontra a obrigação de o arrendador declarar que está recebendo o imóvel arrendado em perfeitas condições de uso e conservação, independentemente do real estado deste.
Com efeito, nos termos da cláusula, tal declaração é condição para a assinatura do contrato, o que restou confirmado pela CAIXA, por exemplo, no petitório que acostou às fls. 437/438 do processo em apenso (anexo aos presentes autos).
Diante da exigência, poder-se-ia argumentar que não é abusiva, pois o consumidor, verificando que o imóvel não se encontra em perfeito estado de uso ou de conservação, poderia negar-se a assinar a declaração, assim como a assinar o contrato de arrendamento, desistindo do negócio jurídico.
Todavia, tendo em conta que estamos falando de um programa do Governo Federal, cuja finalidade é facilitar o acesso da população de baixa renda à casa própria e em que os beneficiários são previamente habilitados, conforme condições estabelecidas pelo agente gestor, não se pode descurar da necessidade destes em participar do mesmo, de sorte que a questão não pode, e nem deve, ser resolvida com a solução simplista de desistência do contrato, pelo consumidor, em caso de o imóvel a ser arrendado ser entregue em mau estado.
Realmente, tratando-se de contrato inserido no PAR - Programa de Arrendamento Residencial, é inarredável que o desejo dos consumidores, futuros arrendatários, é participar do mesmo, havendo até mesmo disputa para tanto. Nesse contexto, exigir-se a declaração em comento sem que ela retrate a realidade do imóvel arrendado é sim prática abusiva, pois o consumidor, em vista da necessidade de contratar, acabará cedendo ao apelo do fornecedor e prestando declaração não consentânea com a realidade, a qual finda por exonerar o fornecedor da sua responsabilidade por vícios no imóvel.
Destarte, amoldando-se a cláusula 20ª, c, do contrato em estudo aos termos do art. 51, I, do CDC, deve tal alínea ser declarada abusiva, sendo extirpada do contrato, de sorte que o agente gestor do PAR poderá exigir apenas declaração do arrendatário a respeito do estado de uso e conservação do imóvel arrendado, sem direcioná-lo a uma afirmação obrigatoriamente positiva.
A cláusula 21ª, por sua vez, dispõe:

"CLÁUSULA VIGÉSIMA PRIMEIRA - DA CONSERVAÇÃO E OBRAS - Fica vedada qualquer alteração ou modificação de aparência, estrutura ou projeto do imóvel objeto deste contrato sem a prévia e expressa anuência da ARRENDADORA.

PARÁGRAFO ÚNICO - Fica assegurado à ARRENDADORA, ou a quem ela indicar, o direito de inspecionar o bem arrendado, a qualquer tempo, comprometendo-se os ARRENDATÁRIOS a facilitar o livre acesso ao imóvel sempre que solicitado, podendo a ARRENDADORA exigir dos ARRENDATÁRIOS, constatado qualquer defeito, falta, uso inadequado, ou manutenção imprópria, que sejam feitos no prazo estipulado, os reparos ou consertos necessários ou a devida reposição. A inspeção constitui faculdade da ARRENDADORA e dela, ou de sua falta, não decorre qualquer direito para os ARRENDATÁRIOS, nem, realizada ou não, os exime do cumprimento dos seus encargos e obrigações.".

No atinente a esta cláusula, a meu sentir, não merece prosperar o pleito ministerial, não sendo imprescindível seja a mesma abolida da avença. É que se apresenta possível a permanência da prescrição no instrumento contratual, desde que com temperamentos, a fim de evitar-se a interpretação de que o arrendatário é responsável exclusivo pela reparação de qualquer vício ou defeito existente no bem, independentemente de sua origem.
Com efeito, ficando claro que os defeitos e faltas a serem reparados pelo arrendatário são aqueles originados do uso inadequado do imóvel ou de manutenção imprópria, extirpa-se qualquer abusividade da cláusula, impedindo-se que a arrendadora dela faça uso para se eximir de sua responsabilidade de fornecedora, o que configuraria a situação descrita no art. 51, IV, do CDC.
Assim penso porque, tratando-se de contrato de arrendamento residencial, em que o bem arrendado, embora na posse do consumidor/arrendatário, não deixa de pertencer ao arrendador (no caso, o FAR, o qual é gerido pela CAIXA, sendo por esta representado no contrato), apresenta-se justificado o interesse de tal empresa pública no bom uso e conservação do bem e em que os problemas decorrentes da má utilização do imóvel sejam reparados por quem lhe deu casa.
Desse modo, tenho que o parágrafo único da cláusula 21ª não precisa ser extirpado do contrato, devendo apenas ser reinscrito nos seguintes termos (destaque para o trecho alterado):

"PARÁGRAFO ÚNICO - Fica assegurado à ARRENDADORA, ou a quem ela indicar, o direito de inspecionar o bem arrendado, a qualquer tempo, comprometendo-se os ARRENDATÁRIOS a facilitar o livre acesso ao imóvel sempre que solicitado, podendo a ARRENDADORA exigir dos ARRENDATÁRIOS, constatado qualquer defeito ou falta, resultante do uso inadequado ou da manutenção imprópria do bem arrendado, que sejam feitos, no prazo estipulado, os reparos ou consertos necessários ou a devida reposição. A inspeção constitui faculdade da ARRENDADORA e dela, ou de sua falta, não decorre qualquer direito para os ARRENDATÁRIOS, nem, realizada ou não, os exime do cumprimento dos seus encargos e obrigações.".

Por fim, dita a cláusula 22ª, também impugnada nestes autos:

"CLÁUSULA VIGÉSIMA SEGUNDA - DAS BENFEITORIAS E ACESSÕES - Qualquer modificação ou alteração do imóvel objeto deste contrato acederá ao imóvel, nos termos da legislação vigente, cujas despesas de regularização junto aos órgãos competentes correrá por conta exclusiva dos ARRENDATÁRIOS, não cabendo a estes qualquer direito de retenção em relação a taxa de arrendamento, indenização ou reembolso dos valores despendidos.".

Tratando-se de bem pertencente à arrendadora, não vejo óbice a que as alterações no bem arrendado somente se façam com sua anuência e por conta e risco do arrendatário, que não terá direito a reembolso das despesas efetuadas em caso de rescisão do contrato ou de, a seu término, optar pela devolução do bem.
Todavia, quando for o caso de realização de benfeitoria necessária, imperioso registrar que, não obstante seja imprescindível a anuência ou, ao menos, o conhecimento da arrendadora acerca da alteração realizada, não se pode olvidar que, invariavelmente, o arrendatário terá direito a ser reembolsado do valor despendido, nas hipóteses de rescisão contratual ou de opção pela devolução do imóvel, ao fim da avença.
Assim, tenho que a cláusula 22ª do contrato em testilha é abusiva, nos termos do art. 51, XVI, do CDC, na medida em que implica na "renúncia do direito de indenização por benfeitorias necessárias", não merecendo ser extirpada da avença, mas reinscrita nos seguintes termos (destaque para o trecho alterado):

"CLÁUSULA VIGÉSIMA SEGUNDA - DAS BENFEITORIAS E ACESSÕES - Qualquer modificação ou alteração do imóvel objeto deste contrato acederá ao imóvel, nos termos da legislação vigente, cujas despesas de regularização junto aos órgãos competentes correrá por conta exclusiva dos ARRENDATÁRIOS, não cabendo a estes qualquer direito de retenção em relação à taxa de arrendamento, indenização ou reembolso dos valores despendidos, salvo em caso de realização de benfeitoria necessária.".


II.2.3 - Cláusula 7ª, caput e §§ 3º e 4º.

Segundo o órgão ministerial, o caput e os parágrafos 3º e 4º da cláusula 7º do contrato em estudo devem ser igualmente anulados. O caput, em face de incidir na vedação prevista no art. 39, I, da legislação consumerista, pois configura a denominada "venda casada"; os §§ 3º e 4º, por excluir a cobertura de invalidez permanente decorrente de doença ou acidente preexistente e, nos primeiros doze meses de vigência do contrato, a cobertura do seguro por morte decorrente das mesmas situações.
Em sua defesa, a CAIXA alegou que a cláusula impugnada foi editada no exercício da autonomia que lhe foi conferida pela Lei nº 10.188/2001, ao lhe atribuir poderes para adotar critérios técnicos para operacionalização do PAR, justificando-se a obrigatoriedade do arrendatário contratar seguro de vida pela necessidade de se resguardar a moradia da sua família, em caso de óbito prematuro ou invalidez permanente. Além disso, é ínfimo o valor do prêmio acordado.
De outro lado, sustentou que as restrições dos parágrafos 3º e 4º, ao contrário do aduzido pelo representante do parquet, não estão em dissonância com os termos da Portaria nº 03, de 15 de março de 2001, editada pela Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça.
Vejamos a dicção da cláusula reputada abusiva:

"CLÁUSULA SÉTIMA - DOS SEGUROS - Durante a vigência deste contrato de financiamento é obrigatória a contratação de seguro de vida na modalidade prestamista, para cobertura de riscos de morte e invalidez permanente, conforme previsto na Apólice de Seguro Habitacional do Programa de Arrendamento Residencial - PAR, o qual será processado por intermédio da CAIXA, obrigando-se os ARRENDATÁRIOS a pagar os respectivos prêmios.

(...)

PARÁGRAFO TERCEIRO - Os ARRENDATÁRIOS declaram estar cientes de que não contarão com a cobertura de invalidez permanente resultante de acidente ocorrido ou doença comprovadamente existente antes da data de assinatura deste instrumento.

PARÁGRAFO QUARTO - Os ARRENDATÁRIOS declaram, ainda, estar cientes de que nos 12 (doze) primeiros meses de vigência do contrato, contados a partir da data de sua assinatura, não contarão com a cobertura do seguro por morte, quando tal sinistro resultar de acidente ocorrido ou doença comprovadamente existente em data anterior à assinatura deste instrumento.".

Inicialmente, a respeito da configuração da chamada "venda casada" na hipótese vertente, observo que, para caracterização da prática abusiva prevista no art. 39, I, do CDC, necessário que a venda conjugada se faça em detrimento do consumidor, ou seja, que apenas o fornecedor aufira vantagens com o negócio. Com efeito, o prejuízo ao consumidor é imprescindível à configuração da prática abusiva. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados:

"ADMINISTRATIVO. CONTRATO BANCÁRIO. SFH. TABELA PRICE. JUROS. TR. INPC. SEGURO. MULTA. COMPENSAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. A jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça ampara o entendimento no sentido da inviabilidade da Tabela Price aos contratos habitacionais. Em sede de recurso especial, a Terceira Turma daquela Corte homenageou o entendimento defendido pelo erudito Desembargador ADÃO SÉRGIO CASSIANO DO NASCIMENTO, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, adotado pelo Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon. (Resp 668.795/RS, Relator o Ministro JOSÉ DELGADO. Face ao entendimento do STJ, de que há efetiva cobrança de juros capitalizados ou compostos quando utilizada a Tabela PRICE, reposicionado o meu voto na matéria, acompanho na integralidade os fundamentos já adotados nesta Corte Regional da Quarta Região pelo Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, para afastar a capitalização dos juros existente com a aplicação da Tabela Price). 2. O contrato em tela é de 01 de setembro de 1993. Os juros moratórios incidirão da citação, à taxa de 6% ao ano até dezembro de 2002 e de 1% ao mês a partir de janeiro de 2003 (na forma dos arts. 406 e 2.044 do Código Civil de 2002 c/c o art. 161, § 1.° do Código Tributário Nacional).
3. A Terceira Turma da Corte tem manifestado o entendimento no sentido de manter a TR como índice de correção, mesmo em contratos anteriores à Lei 8.177/91, uma vez que, tal índice substituído pelo INPC, estaria conspirando contra o interesse do mutuário apelante, porquanto a TR revelou variação inferior à do INPC.
4. No tocante à contratação do seguro, trata-se o caso de coberturas diferenciadas em relação às usualmente praticadas no mercado. As condições de contratação serão diferentes das usuais. A Lei 4380/64 estabeleceu a obrigatoriedade de contratação de seguro vinculado ao contrato. A venda casada não pressupõe necessariamente a ilegalidade da contratação. Faz-se necessária a comprovação de que essa operação resultou em prejuízo efetivo ao consumidor, o que nos autos não ficou caracterizado. Referente ao tema, mantida a sentença.
5. O Superior Tribunal de Justiça vem decidindo que "a redução da multa moratória de 10% para 2%, tal como definida na Lei n.° 9.296/96, que modificou o Código de Defesa do Consumidor, é possível para os contratos celebrados após a sua vigência, caso dos autos" (AGRESP 571469/PR, DJ 25.02.2004).
6. Ainda que no momento não se possa identificar o credor ou devedor da relação, fica autorizada a compensação ou repetição do indébito, na forma simples.
7. Honorários advocatícios redistribuídos na faixa de 50% para os autores e 50% para a Caixa. Mantido o quantum fixado.
8. Apelo dos autores parcialmente provido e apelo da Caixa Seguradora S/A improvido.". (TRF 4ª, AC 200171000186669/RS, 3ª Turma, Relator Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, j. 17/04/2007, DE 20/06/2007, com grifos acrescidos).

"CIVIL. SFH. CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL. ANULAÇÃO DE CLÁUSULAS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. PLANO DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL. ANATOCISMO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. TAXA DE JUROS. LEGALIDADE.
1. Improcede o pleito de anulação das cláusulas que preconizam a execução judicial ou extrajudicial do saldo residual, a instituição de multa moratória, e a chamada "venda casada" em contrato de mútuo habitacional firmado com a CEF, no caso em que o mutuário deixou de comprovar os prejuízos decorrentes de sua aplicação.
2. Não restou comprovado o descumprimento da cláusula de equivalência salarial.
3. "O art. 6.º, "c", da Lei n.º 4.380/64 não estabelece limitação da taxa de juros, apenas dispõe sobre as condições para a aplicação do reajuste previsto no art. 5.º da mesma Lei". (STJ, EDRESP n.º 415.588, Segunda Seção, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 01/12/2003).
4. Afastada a alegação de anatocismo na sistemática de amortização do saldo devedor, que utiliza o Sistema Francês de Amortização - Tabela Price, pois não a amortização negativa constatada deveu-se tão somente à inadimplência dos mutuários.
5. Apelação improcedente.". (TRF 5ª, AC 305454/PE, 4ª Turma, Relator Desembargador Federal Marcelo Navarro, j. 26/10/2004, DJ 07/03/2005, p. 697, com grifos acrescidos).

Tem igualmente entendido a jurisprudência pátria que não configura a prática abusiva da "venda casada" a exigência da CAIXA, nos contratos de mútuo firmados no âmbito do SFH, no sentido de que o mutuário contrate seguro de vida quando da avença, tendo em vista a natureza do seguro contratado, que visa não só à cobertura dos sinistros a que estaria sujeito o imóvel objeto da avença, mas também dos eventos morte e invalidez permanente a que está sujeito o contratante, com vistas a propiciar que, não obstante estas situações, fique garantido à sua família o direito à moradia, guardando, portanto, plena pertinência com o objeto do contrato principal.
Nesse sentido é válida a transcrição das ementas dos seguintes julgados:

"SFH. CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO E DO SALDO DEVEDOR. TABELA PRICE. CES. SEGURO.
1. Comprovado que a CEF vinha reajustando as prestações por índices superiores aos que decorrem da aplicação do Plano de Equivalência Salarial, faz jus o mutuário à revisão dos encargos mensais.
2. É legítima a cobrança do percentual referente ao CES, porque determinante na redução do resíduo ao final do prazo de amortização. Situação em que o coeficiente está especificado no contrato, que foi assinado após a Lei que expressamente determinou sua utilização.
3. A utilização da URV, na mesma proporção em que incidiu para reajustar os salários dos mutuários, não contraria o sistema do PES/CP, pois as prestações continuam vinculadas aos salários e o saldo devedor pelo índice básico de reajuste da poupança, que sofreu oinfluxo do mesmo indexador.
4. Nos contratos assinados após a Lei nº 8.692/93, o teto dos juros
remuneratórios será de 12% ao ano.
5. O seguro contratado no âmbito do SFH tem previsão de coberturas especiais, não estando voltado apenas à conservação do bem dado em garantia hipotecária, mas também à liquidação do saldo devedor em caso de morte ou invalidez permanente do mutuário. A chamada "venda casada" do seguro não resulta na exclusão da obrigação de pagamento ou na possibilidade de escolha de nova seguradora, quando não demonstrado que dessa operação resultou prejuízo mensurável ao mutuário.
6. A Tabela Price não capitaliza juros sob a forma composta, pois os juros, obtidos a partir da incidência do equivalente mensal da taxa nominal sobre o saldo devedor, são integralmente pagos com a prestação mensal de amortização e juros. O que provoca o desequilíbrio contratual é o desvirtuamento do sistema de amortização, mediante alteração de seus componentes - prestação e
juros, que sofrem o influxo da atualização por índices diversos, prejudicando a previsibilidade do sistema, que é concebido, como qualquer outro sistema de amortização, para que a dívida contraída seja integralmente paga pela prestação ajustada, em prazo previamente acertado, e respeitada a taxa de juros contratada. A solução passa pelo reequilíbrio da equação econômica inicial e não pela substituição ou eliminação do sistema de amortização.
7. A fim de garantir que toda a prestação seja destinada à amortização de parte da dívida, nos termos das leis 4380/64 e 8.629/93, sempre que a prestação mensal do mútuo habitacional for insuficiente para a amortização do saldo devedor, observado o coeficiente originalmente projetado, e que decorre da Tabela Price, seu montante será imputado, primeiramente, no pagamento do saldo devedor e, o que sobejar, direcionar-se-á ao pagamento dos juros da dívida. Remanescendo juros impagos, serão contabilizados em separado do saldo devedor, o que evitará a capitalização composta.
8. Apelação do autor provida em parte. Apelação da CEF desprovida.". (TRF 4ª, AC 200304010305015/PR, 4ª Turma, Relatora Desembargadora Federal Taís Schilling Ferraz, j. 24/11/2004, DJU 19/01/2005, p. 207, com grifos acrescidos).

Tal jurisprudência parece-nos aplicável ao caso presente. É que, embora não exista previsão na lei que rege o PAR da necessidade de contratação de seguro pelo arrendatário, não se pode descurar que, a exemplo do que ocorre no âmbito do SFH, também nas avenças travadas dentro do programa se procura, com a obrigatoriedade da contratação de seguro pelo arrendatário, assegurar a sua família o direito à moradia em caso de sua morte ou invalidez permanente, sendo plenamente justificável e razoável a exigência.
Outrossim, como bem frisou a CAIXA em sua defesa, na hipótese, o valor ínfimo cobrado mensalmente do arrendatário a título de prêmio do seguro não permite reconheçamos que a contratação do seguro realizou-se em seu prejuízo, configurando prática abusiva do agente financeiro.
Nessa quadra, importa ainda frisar que nem mesmo o fato de o seguro ser contratado com empresa indicada pela CAIXA parece-me afrontar o direito dos arrendatários, consumidores do serviço fornecido pela arrendadora, justamente em face do pequeno valor do prêmio do seguro e das vantagens da cobertura oferecida.
Ademais, não se pode olvidar que a contratação do seguro pelos arrendatários também permite o melhor gerenciamento do PAR, o que é curial para que um número maior de cidadãos possa ser beneficiado com o programa que, como acima ressaltado, visa satisfazer o direito constitucional da população de baixa renda à moradia.
No que atine às restrições de cobertura previstas nos parágrafos 3º e 4º da cláusula em análise, observo que as alegações do parquet igualmente não merecem acolhida, não vislumbrando abusividade nas mesmas.
Aliás, como referido pela CAIXA, a Portaria nº 03, de 15 de março de 2001, emitida pela Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, invocada pelo órgão ministerial para supedanear seus argumentos, antes de reforçá-los, infirma-os, ao ressalvar que cláusulas que tais não serão consideradas abusivas quando a seguradora comprovar que o consumidor tinha conhecimento da doença pré-existente ao contrato.
Ora, no caso presente, está claro no contrato que a cobertura por invalidez permanente ou por morte, esta se ocorrida nos primeiros doze meses da avença, somente será excluída se comprovado que o acidente ou a doença que ocasionou o resultado era pré-existente ao contrato. Logo, em não se provando que o arrendatário conhecia a doença que portava à época da contratação, não será excluída a cobertura, o que satisfaz a exigência da Portaria emitida pela SED/MJ, referida pelo representante do MPF.
Destarte, não vejo qualquer abusividade nas previsões insertas na cláusula 7ª do contrato em estudo, rechaçando as alegações ministeriais nesse sentido.


II.2.4 - Cláusula 14ª.

Dispõe a cláusula em referência:

"CLÁUSULA DÉCIMA QUARTA - DA IMPONTUALIDADE NO PAGAMENTO DOS ENCARGOS MENSAIS - Ocorrendo impontualidade no pagamento das taxas de arrendamento e prêmios de seguro, a quantia a ser paga corresponderá ao valor da obrigação vencida, atualizada com base no critério de ajuste pro rata die, definido em legislação específica vigente à época do evento, no período compreendido entre a data do vencimento, inclusive, até a data do efetivo pagamento, exclusive, mediante aplicação do mesmo índice de atualização aplicável às taxas de arrendamento.

PARÁGRAFO ÚNICO - Sobre a importância calculada na forma do caput desta cláusula, incidirão juros moratórios, à razão de 0,033% (trinta e três milésimos por cento) ao dia sobre as parcelas em atraso e multa contratual de 2% (dois por cento) sobre o valor total devido.".

Em face dessas prescrições, alegou o representante do MPF a nulidade da cláusula, afirmando enquadrar-se no rol de cláusulas abusivas constante na Portaria nº 4, de 13 de março de 1998, emitida pela Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, na medida em que não define qual será o índice de correção utilizado para atualização do valor do débito, na hipótese de atraso no pagamento da taxa de arrendamento ou do prêmio do seguro, deixando ao talante da arrendadora a fixação de tal índice.
A CAIXA, a seu turno, sustentou em sua defesa que não existe a abusividade apontada pelo parquet, pois há sim previsão na cláusula 14ª do índice de correção a ser aplicado na hipótese, qual seja, aquele utilizado para remuneração básica dos saldos de contas vinculadas ao FGTS, atualmente a TR.
Mais uma vez não vejo como prosperar a alegação do órgão ministerial. Isso porque, conforme aduzido pela empresa pública federal, há sim previsão na cláusula em estudo do índice de correção a ser aplicado na atualização do valor da dívida, em caso de atraso no pagamento dos encargos mensais da avença.
De fato, como asseverado pela CAIXA, segundo previsão expressa na cláusula em comento, em casos que tais, deverá ser utilizado o mesmo índice de atualização aplicável às taxas de arrendamento, o qual, nos termos da cláusula 6ª do contrato, é aquele "aplicado às contas vinculadas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, acumulado nos últimos 12 (doze) meses ou o índice que vier a substituí-lo".
Sendo assim, tenho que deve ser indeferido o pleito do órgão ministerial formulado no sentido de que seja reinscrita a cláusula 14ª do contrato em testilha, em face de sua abusividade.


II.2.5 - Cláusula 5ª.

Prescreve a cláusula em alusão:

"CLÁUSULA QUINTA - DOS ENCARGOS MENSAIS - O ARRENDATÁRIO obriga-se ao pagamento mensal da taxa de arrendamento, prêmios de seguros e taxas de condomínio, quando for o caso, na forma, prazos e condições estabelecidos neste instrumento."

Para fundamentar sua pretensão de que tal disposição contratual seja revista, argüiu o parquet a necessidade de se discriminar na cláusula quais espécies de taxas de condomínio devem ser pagas pelo arrendatário, já que, como o bem arrendado pertence à arrendadora, esta deveria arcar com as despesas condominiais extraordinárias e o arrendatário, apenas com aquelas ditas ordinárias.
Nesse sentido, defendeu a aplicação analógica do disposto na Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, quanto às obrigações do locador e do locatário com relação às despesas condominiais, equiparando-se o locador ao arrendador e o locatário, ao arrendatário.
Em sua contestação, a CAIXA afirmou que a equiparação sugerida pelo representante do MPF deve ser vista com temperamentos, uma vez que estamos tratando de contratos jurídicos diversos. Por outro lado, asseverou que não é a simples denominação de despesa ordinária ou extraordinária que ditará o responsável pelo seu custo, ressaltando a necessidade de que, para tanto, seja analisada a causa da despesa.
Nesse ponto, tenho que assiste razão ao órgão ministerial. Embora os contratos de locação e de arrendamento residencial tenham natureza jurídica diversa e a Lei nº 8.245/91 discipline apenas o primeiro, não se pode olvidar que, a respeito das obrigações do arrendador e do arrendatário quanto às taxas condominiais incidentes sobre o bem arrendado, não há previsão na lei de regência do arrendamento residencial (Lei nº 10.188/2001), havendo necessidade de que sejam estabelecidas conforme a razoabilidade e o direito que cada contratante detém sobre o bem.
Desse modo, tenho que se apresenta bastante justa a aplicação analógica, ao contrato de arrendamento residencial, das disposições da Lei nº 8.245/91 atinentes às obrigações do locador e do locatário quanto às taxas condominiais, haja vista que, em ambos os contratos, o locador e o arrendador, embora não detenham a posse sobre o imóvel, conservam a sua propriedade, de sorte que devem arcar com todas as despesas relativas à realização de melhorias no bem, na medida em que estas se incorporam a sua propriedade. Tais despesas, chamadas extraordinárias, são aquelas previstas no parágrafo único do art. 22 da Lei nº 8.245/91.
Nessa linha de raciocínio, caberia ao arrendatário, quanto às taxas condominiais, a obrigação de custear apenas as despesas ordinárias, que são aquelas previstas no parágrafo primeiro do art. 23 da legislação em comento, pois sempre lhe aproveitam.
Nessa quadra, observo que não procede a alegação da empresa pública, no sentido de que, no caso presente, por exemplo, a CAIXA não deve custear a instalação de um playground no condomínio residencial ou substituir bens permanentes da área comum, que sejam furtados ou roubados. Ora, se os imóveis arrendados, como defende a CAIXA, pertencem a tal empresa pública até que os arrendatários optem pela compra dos mesmos ao fim do prazo do arrendamento, é certo que as despesas com melhorias que venham a acrescer ao imóvel deverão ser custeadas pelo seu proprietário, ou seja, o arrendador.
Tal afirmação, todavia, não tem o condão de autorizar, verbi gratia, que os arrendatários do Condomínio Residencial Sampaio Correia decidam amanhã, em assembléia, que deve ser instalado um playground na área comum do Conjunto, realizem a despesa e enviem a conta para a arrendadora. De forma alguma. Embora a despesa dessa natureza deva ser custeada pela CAIXA, não se pode olvidar da previsão contratual inserta na cláusula 21ª, no sentido de que qualquer alteração ou modificação na aparência, estrutura ou projeto do imóvel arrendado somente pode ser realizada com a anuência da arrendadora.
Assim, na hipótese ventilada, embora a despesa deva ser custeada pela CAIXA, somente poderá a melhoria, ou seja, a instalação de playground, ser realizada com sua anuência.
Destarte, tenho que a cláusula 5ª da avença também deve ser reinscrita, nos seguintes termos, a fim de esclarecer a natureza das taxas condominiais que devem ser suportadas pelos arrendatários (alterações em destaque):

"CLÁUSULA QUINTA - DOS ENCARGOS MENSAIS - O ARRENDATÁRIO obriga-se ao pagamento mensal da taxa de arrendamento, prêmios de seguros e taxas de condomínio relativas a despesas ordinárias, quando for o caso, na forma, prazos e condições estabelecidos neste instrumento."


II.2.6 - Cláusula 16ª, caput e §§ 2º e 3º.

Eis a dicção da cláusula em comento:

"CLÁUSULA DÉCIMA SEXTA - DA SUBSTITUIÇÃO DO BEM ARRENDADO - Por solicitação dos ARRENDATÁRIOS, o bem arrendado poderá ser substituído por outro equivalente ou de valor diverso, desde atendidas, cumulativamente, as seguintes condicionantes:

(...)

PARÁGRAFO SEGUNDO - Na hipótese de os encargos relativos ao imóvel substituto serem inferiores aos até então devidos pelos ARRENDATÁRIOS, não lhes caberá qualquer devolução ou compensação dos valores pagos.

PARÁGRAFO TERCEIRO - Se o valor dos encargos relativos ao imóvel substituto forem superiores aos até então devidos pelos ARRENDATÁRIOS, a diferença apurada será integralmente assumida pelos ARRENDATÁRIOS e poderá ser paga à vista, na data da assinatura do instrumento contratual respectivo ou incorporada, no todo ou parte, ao valor dos encargos relativos ao arrendamento do imóvel substituto.".

Segundo o órgão ministerial, tal cláusula encontra-se eivada de nulidade, pois coloca o consumidor em desvantagem exagerada relativamente ao fornecedor, nos termos do art. 51, IV, do CDC, ao prever que, havendo substituição do imóvel arrendado por outro de maior valor, o arrendatário deverá arcar com os custos da diferença, mas, se o imóvel substituído for de valor superior ao substituto, nenhuma diferença será devida ao arrendatário pela entidade financeira.
Em contestação, a CAIXA sustentou a inexistência da desvantagem exagerada alegada pelo parquet, ao fundamento de que a substituição do bem arrendado por outro de menor ou maior valor é opção do arrendatário. Além disso, como a taxa de arrendamento serve ao mesmo tempo para pagar a ocupação do bem e sua aquisição, havendo modificação no valor do imóvel, necessária a realização de ajustes no contrato. Assim é que, se o bem substituto for de valor maior que o do bem substituído, o arrendatário deverá arcar com essa diferença. Do mesmo modo, na hipótese contrária, a diferença paga a maior pelo arrendatário não lhe será devolvida, mas computada no contrato, a fim de reduzir o valor da taxa de arrendamento do bem substituto.
Analisando a cláusula em testilha, observo que, embora a CAIXA defenda que, na hipótese de substituição do bem originalmente arrendado por outro de valor inferior, o quantum pago a maior pelo arrendatário será computado para abatimento do débito relativo ao bem substituto, não é essa verdade que se extrai da prescrição contratual sob estudo.
De fato, a disposição contratual é clara no sentido de que, havendo substituição do bem arrendado por outro de inferior valor, não caberá aos arrendatários "qualquer devolução ou compensação dos valores pagos" (parágrafo segundo da cláusula).
Ora, diante de cláusula tão leonina, não é preciso grande esforço intelectivo para se chegar à mesma conclusão encontrada pelo representante do MPF. De fato, resta clarividente da leitura da mesma que, na hipótese, o consumidor foi colocado em desvantagem exagerada, nos termos previstos no art. 51, IV, da legislação consumerista, fato a ensejar a nulidade da cláusula.
Contudo, como bem asseverado pelo parquet, melhor para as partes que, nesse caso, a cláusula não seja extirpada da avença, mantendo-se a possibilidade de substituição do bem originalmente arrendado, já que tal previsão, nesse aspecto, favorece a ambos os contratantes. Assim, tenho que a cláusula deve apenas ser revista, para que seja restaurado o equilíbrio da relação contratual.
Desse modo, acato os argumentos do órgão ministerial quanto à necessidade de reinscrição da cláusula 16ª da avença, especialmente do seu parágrafo 2º, a fim de que seja resguardado ao arrendatário que, na hipótese de substituição do bem arrendado por outro de menor valor, o quantum que tenha pago a maior seja computado para abatimento do saldo devedor relativo ao bem substituto, de maneira a reduzir o valor da taxa mensal de arrendamento inicialmente fixada para este último imóvel.
Na mesma esteira, em caso de o montante pago a maior pelo arrendatário superar o valor do saldo devedor do bem substituto, é certo que terá o consumidor direito também à devolução dessa diferença.
Sendo assim, tenho que o parágrafo 2º da cláusula 16ª do contrato em análise deve ser reinscrito nos seguintes termos (alterações destacadas):

"PARÁGRAFO SEGUNDO - Na hipótese de os encargos relativos ao imóvel substituto serem inferiores aos até então devidos pelos ARRENDATÁRIOS, caberá a estes a compensação dos valores pagos com o saldo devedor relativo ao imóvel substituto, apurado ao tempo da substituição. Sendo a diferença paga pelos ARRENDATÁRIOS maior do que o saldo devedor do imóvel substituto, terão ainda direito à devolução do montante que sobejar."


II.2.7 - Cláusulas 19ª e 24ª.

Prescreve a cláusula 19ª:
"CLÁUSULA DÉCIMA NONA - DO INADIMPLEMENTO - Em caso de inadimplemento dos arrendatários quanto ao pagamento das obrigações contratuais ora assumidas, fica facultado à ARRENDADORA, ou a quem ela indicar, optar pela adoção das medidas previstas na cláusula anterior ou, caso assim prefira, cumulativa ou alternativamente, adotar as seguintes medidas:

I - notificar os ARRENDATÁRIOS para que, em prazo determinado, cumpram as obrigações que deixaram de cumprir sob pena de vencimento antecipado do contrato e execução do débito;

II - rescindir de pleno direito o presente contrato de arrendamento, notificando os ARRENDATÁRIOS, para que, em prazo determinado:
a) devolvam o imóvel arrendado, sob pena de caracterização de esbulho possessório que autoriza a ARRENDADORA, ou a quem ela indicar, a propor a competente ação de reintegração de posse; e,
b) no mesmo prazo, paguem o valor do débito em atraso acrescidos dos encargos no parágrafo segundo desta cláusula, sob pena de ver tais quantias serem cobradas em ação executiva, cujo ajuizamento importará ainda, na cobrança de honorários advocatícios calculados à razão de 20% (vinte por cento) do valor da dívida;
c) se houver atraso ou recusa na restituição do bem arrendado, os ARRENDATÁRIOS estarão sujeitos a pagar multa diária de 1/30 (um trinta avos) da taxa de arrendamento mensal convencionado, cobrável, em caso de não pagamento, por meio de ação executiva.
III - vedar aos ARRENDATÁRIOS novo acesso ao Programa de Arrendamento Residencial e a bens de propriedade do Fundo de Arrendamento Residencial.

PARÁGRAFO PRIMEIRO - A mora produzir-se-á de pleno direito, ocorrendo quaisquer das hipóteses acima mencionadas, independentemente de notificação judicial ou extrajudicial.

PARÁGRAFO SEGUNDO - Qualquer quantia que a ARRENDADORA concordar em receber em atraso, será havido como mera tolerância, sem importar em novação ou alteração do presente contrato, devendo ao principal serem acrescidos:
a) atualização monetária pelo mesmo índice de atualização aplicados aos depósitos do FGTS, calculado pro rata die;
b) juros moratórios à razão de 0,033% (trinta e três milésimos por cento) ao dia sobre o débito atualizado;
c) multa de 2% (dois por cento) sobre o montante do débito atualizado.".

No tocante a essa disposição contratual, argüiu o parquet várias nulidades, postulando que a cláusula seja extirpada da avença.
Por primeiro, questionou o representante do MPF o fato de constar no contrato que, na hipótese de execução do débito pela arrendadora, em caso de inadimplemento do arrendatário, este arque com honorários advocatícios de 20% (vinte por cento) sobre o valor da dívida, além dos demais encargos decorrentes da mora, sem prever o mesmo direito para a hipótese do arrendatário necessitar executar o contrato.
Tal prescrição contratual, a seu ver, ao incumbir o arrendatário de, além de custear os honorários de seu próprio advogado e os de sucumbência, se for vencido na causa, arcar também com as despesas relativas aos honorários do causídico contratado pela arrendadora, mostra-se abusiva e ilegítima, por colocar o consumidor em desvantagem exagerada e não prever igual direito em seu favor, enquadrando-se no disposto no art. 51, IV e XII, do CDC, além de violar o sistema instituído pelo Estatuto da Advocacia.
Em face de constar previsão semelhante na cláusula 24ª da avença, esta também foi impugnada pelo órgão ministerial.
Por segundo, alegou o parquet a abusividade do inciso III da referida cláusula 19ª, sob o fundamento de que é ilegal a inserção no contrato de hipótese de vedação de participação do cidadão no PAR sem supedâneo na lei que rege o programa ou nas diretrizes emitidas pela Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano. A seu ver, a CAIXA, como parte da administração pública, deve pautar-se pelo princípio da legalidade estrita, fazendo somente aquilo que a lei permite expressamente.
Por terceiro, asseverou o autor da ação a nulidade do caput, do inciso II e do parágrafo 2ª da cláusula em comento, que confere à arrendadora a faculdade de, diante do inadimplemento contratual dos arrendatários, rescindir unilateralmente o contrato, exigindo a devolução do bem arrendado, sob pena de configuração de esbulho possessório, bem como o pagamento das prestações em atraso, sem antes notificá-lo para purgar a mora.
No entender do representante do MPF, é inadmissível tal previsão contratual, já que o escopo da avença não é o lucro, mas propiciar à população de baixa renda o acesso à casa própria. Desse modo, não se pode conceber que, diante do inadimplemento contratual, a CAIXA, antes de notificar o arrendatário para facultar-lhe a purgação da mora, decida por rescindir unilateralmente a avença.
Para reforçar seus argumentos, o parquet colacionou aos autos jurisprudência dos tribunais pátrios no sentido de suas alegações.
Em sua defesa, no que concerne à primeira impugnação do requerente, a CAIXA limitou-se a afirmar ser legal e legítima a inserção no contrato de cláusula que preveja, na hipótese de inadimplemento, que o arrendatário arque com os honorários devidos ao causídico da CAIXA, a qual não pode ficar no prejuízo em face da desídia do arrendatário. Interpretar-se o fato diferentemente seria permitir o enriquecimento ilícito do consumidor.
No atinente à vedação de novo acesso ao PAR pelo arrendatário inadimplente, cujo contrato seja rescindido, afirmou o ente paraestatal a sua legitimidade, vez que lhe era possível inserir tal disposição no contrato, em vista da autonomia que lhe conferiu a Lei nº 10.188/2001 para definir os critérios de operacionalização do PAR. Aduziu, ademais, o caráter pedagógico e isonômico do procedimento, alegando que não seria justo vedar o acesso ao PAR a pessoas que nunca participaram do programa, em prol de cidadãos que, embora selecionados para beneficiarem-se com o mesmo, foram desidiosos no cumprimento de suas obrigações contratuais. A seu ver, agir como pretende o MPF seria privilegiar o mau pagador em detrimento daquele que não teve oportunidade de participar do PAR.
Por fim, com relação à falta de previsão no contrato de que, em caso de inadimplemento, antes da rescisão contratual, seja o arrendatário notificado para purgar a mora, asseverou a empresa pública ré a improcedência das alegações ministeriais, haja vista o disposto no inciso I da cláusula 19ª da avença, que prevê justamente essa necessidade.
Analisando com vagar os argumentos das partes, observo, no concernente à previsão de pagamento, pelo arrendatário inadimplente, dos honorários do advogado contratado pela arrendadora para executá-lo (cláusula 19ª, II, b), que a disposição contratual incide no disposto no art. 51, XII, do CDC, qualificando-se como nula de pleno direito, uma vez que não há previsão no ajuste de idêntico direito em favor do arrendatário.
Nesse sentido, destaco o seguinte precedente do Egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região:

"CIVIL E CONSUMIDOR. SFH. CLÁUSULA ESTABELECENDO PENA CONVENCIONAL DE 10% SOBRE O TOTAL DA DÍVIDA AOS DEVEDORES EM CASO DE DEFLAGRAÇÃO DE EXECUÇÃO JUDICIAL OU EXTRAJUDICIAL. VEDAÇÃO LEGAL. ART. 51, XII, DO CDC. NULIDADE DE PLENO DIREITO. VANTAGEM UNILATERAL. RELAÇÃO DE CONSUMO. SUBMISSÃO DOS
CONTRATOS FIRMADOS NO ÂMBITO DO SFH AO CDC. SÚMULA 297 DO STJ.
1. O mútuo celebrado pelas regras do SFH também se enquadra no conceito de serviço prestado pelo banco, portanto, subordinando-se às normas do Código de Defesa do Consumidor. STJ, súmula 297.
2. O art. 51, inciso XII, do Código de Defesa do Consumidor estabelece a nulidade, de pleno direito, de cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que "obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor".
3. É nula, por violação ao art. 51, XII, do CDC, a cláusula contratual que, em contrato de mútuo habitacional firmado no âmbito do SFH, concede vantagem unilateral a um dos contratantes, estabelecendo pena convencional aos devedores, equivalente a 10% (dez por cento) sobre o total da dívida, em caso de deflagração de execução judicial ou extrajudicial, impondo, ainda, o pagamento de honorários advocatícios, ou do agente fiduciário, conforme o caso.
4. Apelação da CEF improvida.". (TRF 1ª Região, 5ª Turma, AC 200038000028152/MG, Relatora Desembargadora Federal Selene Maria de Almeida, j. 10/10/2007, DJ 09/11/2007, p. 122).

Destarte, nesse ponto, tenho que assiste razão ao parquet, devendo ser reinscrito o item b do inciso II da cláusula 19ª, a fim de ser extirpada do contrato a disposição abusiva. Pelos mesmos motivos, deve ser retirada da avença a cláusula 24ª.
Já no tocante à possibilidade de se vedar acesso ao PAR àquele cidadão que, em contrato de arrendamento residencial anterior, mostrou-se inadimplente, entendo que as alegações ministeriais não merecem a mesma sorte. É que, nesse tópico, compartilho do entendimento esposado pela CAIXA, no sentido de que, havendo disputa entre os interessados em participar do PAR, é bastante justo que aquele que, uma vez agraciado com o programa, não honre com suas obrigações contratuais, não mais seja admitido no mesmo, pois tal medida permitirá que terceiros, em idêntica situação financeira, venham a se beneficiar do programa.
Portanto, não vislumbrando ilegalidade no disposto no inciso III da cláusula 19ª do ajuste, mormente ofensa aos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade, tenho que deve a disposição contratual em testilha ser mantida na avença. Porém, é válido assentar que a medida somente será adotada se, notificado para purgar a mora, manter-se inerte o arrendatário.
Por derradeiro, no que respeita à ausência de previsão contratual de prévia notificação do arrendatário para purgar a mora, em caso de inadimplemento, tenho que também assiste razão ao parquet. Com efeito, a leitura que a empresa pública, por ora, apresenta relativamente ao disposto no caput e incisos da cláusula 19ª não condiz com o que ali está exposto e, permanecendo a redação da prescrição contratual nesses termos, ensejará a adoção de práticas abusivas pela arrendadora quando se encontrar diante do descumprimento contratual por parte de algum arrendatário.
De fato, o caput da cláusula 19ª disciplina que, em caso de inadimplemento, a arrendadora poderá adotar cumulativa ou alternadamente as medidas previstas na cláusula 18ª da avença, assim como aquelas insertas nos seus incisos I, II e III, de modo que a notificação prévia do arrendatário para purgação da mora é tratada como mera faculdade da arrendadora. Essa interpretação é reforçada pelo disposto no parágrafo primeiro da cláusula em comento, que prevê literalmente ser despicienda a notificação prévia do arrendatário para configuração da mora contratual.
Tal disposição contratual está na contramão da jurisprudência e doutrina acerca da matéria, que, já relativamente ao contrato de arrendamento mercantil, consolidaram-se no sentido da necessária notificação prévia do devedor para configuração da mora, rescindindo-se o contrato somente se este não pagar o seu débito.
Em se tratando de arrendamento residencial, cujo escopo é de propiciar o acesso da população de baixa renda à moradia, e não a obtenção de lucro pela arrendadora, imperiosa se mostra a observância desse procedimento prévio, que, frise-se, não prejudica quaisquer das partes contratantes, mas, ao reverso, permite a continuidade do contrato, facultando ao arrendatário o alcance de sua finalidade.
Outrossim, a própria lei de regência do PAR, no seu art. 9º, prevê a necessidade de prévia notificação do arrendatário para pagamento do débito, a fim de se configurar o esbulho possessório que dá ensejo à propositura da ação de reintegração de posse.
Não se pode olvidar, ademais, que a jurisprudência tem assentado que a notificação do arrendatário deve ser pessoal, a fim de lhe assegurar realmente a faculdade de purgar sua mora. Nesse sentido, merecem transcrição os seguintes julgados:

"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL COM OPÇÃO DE COMPRA. NOTIFICAÇÃO. NECESSIDADE.
I - Nos termos do art. 9º da Lei nº. 10.188/2001, a notificação pessoal do mutuário afigura-se indispensável para a configuração do esbulho possessório, e, conseqüentemente, para a proposição da ação de reintegração de posse, independentemente de previsão contrária no "Contrato por Instrumento Particular de Arrendamento Residencial com opção de Compra, tendo por Objeto Imóvel Adquirido com Recursos do PAR - Programa de Arrendamento Residencial".
II - Apelação desprovida.". (TRF 1ª Região, 6ª Turma, AC 200533000162876/BA, Relator Desembargador Federal Souza Prudente, j. 05/03/2007, DJ 20/08/2007, p. 104).

"PROCESSUAL CIVIL. ARRENDAMENTO RESIDENCIAL. ESBULHO POSSESSÓRIO. ARTIGO 9º DA LEI Nº 10.188/01. NECESSIDADE DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO ARRENDATÁRIO. PRECEDENTES DA 2ª SEÇÃO DO STJ, DESTA CORTE, INCLUSIVE, DA 6ª TURMA ESPECIALIZADA E DOS DEMAIS TRF'S. RECURSO NÃO PROVIDO.
- O artigo 9º da Lei nº 10.188/01 prescreve que, para a configuração do esbulho possessório, é imprescindível a notificação do devedor acerca da existência de débitos, a fim de que possa saldá-los e, não ocorrendo o pagamento, no prazo assinalado, restará aquele configurado.
- A jurisprudência é assente no sentido de que a notificação prévia, necessária para embasar a ação de reintegração de posse, deve ser feita pessoalmente ao arrendatário, o que não ocorre na espécie.
- Precedentes da 2ª Seção do STJ, desta Corte, inclusive da 6ª Turma Especializada, e dos demais TRF's.
- Recurso não provido.". (TRF 2ª Região, 6ª Turma Especial, AC 200351100078411/RJ, Relator Desembargador Federal Benedito Gonçalves, j. 17/10/2007, DJ 06/11/2007, p. 236).

"PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. ESBULHO NÃO CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DO ARRENDATÁRIO. ART. 9º, DA LEI 10.188/2001.
I. Não há nos autos prova de que tenha sido o agravado notificado, nos termos determinados pelo art. 9º da Lei 10.188/2001, requisito indispensável para que o inadimplemento das prestações do arrendamento possa acarretar o esbulho.
II. No que se refere à alegação de que a cláusula décima oitava do contrato de arrendamento dispensa a notificação para a configuração do esbulho, a jurisprudência pátria tem entendido ser tal cláusula abusiva, não podendo o arrendatário renunciar ao direito de notificação, previsto legalmente, por meio de cláusula inserta em contrato de adesão. Precedentes.
III. Agravo improvido. Embargos de declaração prejudicados.". (TRF 5ª Região, 4ª Turma, AG 66711/AL, Relatora Desembargadora Federal Margarida Cantarelli, j. 02/05/2006, DJ 17/05/2006, p. 1076, com grifos acrescidos).

Sendo assim, a meu sentir, deve ser reinscrito o caput da cláusula 19ª, a fim de que ali conste a necessidade de, para configuração da mora, notificar-se previamente o arrendatário inadimplente. Na mesma esteira, deve ser extirpado da avença o parágrafo primeiro da mesma cláusula.
Desse modo, eis a nova redação da cláusula 19ª, após a revisão contratual realizada (alterações destacadas):

"CLÁUSULA DÉCIMA NONA - DO INADIMPLEMENTO - Em caso de inadimplemento dos arrendatários quanto ao pagamento das obrigações contratuais ora assumidas, fica facultado à ARRENDADORA, ou a quem ela indicar, optar pela adoção das medidas previstas na cláusula anterior ou, caso assim prefira, cumulativa ou alternativamente, adotar as seguintes medidas, após proceder à notificação judicial ou extrajudicial do arrendatário, para facultar-lhe a purgação da mora no prazo de cinco dias:

I - notificar os ARRENDATÁRIOS para que, em prazo determinado, cumpram as obrigações que deixaram de cumprir sob pena de vencimento antecipado do contrato e execução do débito;

II - rescindir de pleno direito o presente contrato de arrendamento, notificando os ARRENDATÁRIOS, para que, em prazo determinado:
a) devolvam o imóvel arrendado, sob pena de caracterização de esbulho possessório que autoriza a ARRENDADORA, ou a quem ela indicar, a propor a competente ação de reintegração de posse; e,
b) no mesmo prazo, paguem o valor do débito em atraso acrescidos dos encargos no parágrafo segundo desta cláusula, sob pena de ver tais quantias serem cobradas em ação executiva;
c) se houver atraso ou recusa na restituição do bem arrendado, os ARRENDATÁRIOS estarão sujeitos a pagar multa diária de 1/30 (um trinta avos) da taxa de arrendamento mensal convencionado, cobrável, em caso de não pagamento, por meio de ação executiva.
III - vedar aos ARRENDATÁRIOS novo acesso ao Programa de Arrendamento Residencial e a bens de propriedade do Fundo de Arrendamento Residencial.

PARÁGRAFO SEGUNDO - Qualquer quantia que a ARRENDADORA concordar em receber em atraso, será havido como mera tolerância, sem importar em novação ou alteração do presente contrato, devendo ao principal serem acrescidos:
a) atualização monetária pelo mesmo índice de atualização aplicados aos depósitos do FGTS, calculado pro rata die;
b) juros moratórios à razão de 0,033% (trinta e três milésimos por cento) ao dia sobre o débito atualizado;
c) multa de 2% (dois por cento) sobre o montante do débito atualizado.".


II.2.8 - Cláusulas 17ª e 18ª.

Na exordial, impugnou ainda o representante do Ministério Público Federal as cláusulas 17ª e 18ª do contrato, postulando a declaração de sua nulidade, sob o argumento de que são abusivas, haja vista preverem que, caso o contrato de arrendamento residencial seja rescindido por desistência do arrendatário, inadimplência ou ilícito contratual, nenhum valor será devido ao consumidor a título de restituição ou indenização, ainda que em face da realização de benfeitoria.
Em prol de suas alegações, invocou o parquet o art. 53 do CDC, bem assim o item 3 da Portaria nº 03, de 15 de março de 2001, e o item 5 da Portaria nº 04, de 13 de março de 1998, ambas emitidas pela Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, as quais apresentam rol de cláusulas tidas como abusivas.
A CAIXA, a seu turno, em sua defesa, sustentou a impertinência da argumentação do órgão ministerial. A uma, porque o autor pretendeu aplicar ao contrato em testilha legislação afeta aos contratos de compra e venda, que têm natureza jurídica diversa dos contratos de arrendamento. E a duas, porque, até a opção de compra pelo bem, externada ao fim do prazo estipulado para o arrendamento residencial, o arrendatário paga à arrendadora apenas a taxa de ocupação do imóvel, não havendo que se falar em pagamento de valor residual e devolução, ao arrendatário, de quantias pagas a esse título, na hipótese de rescisão da avença, mormente se decorrente de inadimplemento contratual do consumidor.
Para melhor análise da questão, vejamos o que dispõem as cláusulas guerreadas:

"CLÁUSULA DÉCIMA SÉTIMA - DA DESISTÊNCIA POR PARTE DOS ARRENDATÁRIOS - Em caso de desistência do arrendamento, por interesse próprio, que deverá ser notificada, pelo ARRENDATÁRIO, com 30 (trinta) dias de antecedência, à ARRENDADORA, os valores pagos pelos ARRENDATÁRIOS a título de taxa de arrendamento serão apropriados como taxa de ocupação pelo uso do imóvel no período, não lhes cabendo direito a qualquer devolução/restituição, inclusive de benfeitorias.

Parágrafo único - Os ARRENDATÁRIOS deverão restituir o imóvel arrendado no mesmo estado de conservação e habitabilidade recebidos, salvo desgaste natural, comprovando a quitação de todas as demais obrigações contratuais, inclusive as relativas ao condomínio."

"CLÁUSULA DÉCIMA OITAVA - DA RESCISÃO DO CONTRATO - Independentemente de qualquer aviso ou interpelação, este contrato considerar-se-á rescindido nos casos abaixo mencionados, gerando, para os ARRENDATÁRIOS, a obrigação de pagar as taxas de arrendamento vencidas atualizadas na forma deste contrato, bem como a quitação das demais obrigações contratuais, sob pena de execução da dívida assim apurada, e de devolver, incontinente, o imóvel arrendado à ARRENDADORA, sem qualquer direito de retenção ou indenização por benfeitorias, configurando a não devolução, esbulho possessório que enseja a adoção das medidas judiciais cabíveis e multa fixada no inciso II da Cláusula Décima Nona deste instrumento.

I - descumprimento de quaisquer cláusulas ou condições estipuladas neste contrato;
II - falsidade de qualquer declaração prestada pelos ARRENDATÁRIOS neste contrato;
III - transferência/cessão de direitos decorrentes deste contrato;
IV - uso inadequado do bem arrendado;
V - destinação dada ao bem que não seja a moradia do ARRENDATÁRIO e de seus familiares.".

Da leitura das disposições, extrai-se a abusividade das prescrições, na medida em que não permitem a devolução/restituição ao arrendatário sequer das despesas despendidas para realização de benfeitorias necessárias, o que faz com que as cláusulas se enquadrem no art. 51, XVI, do Código de Defesa do Consumidor.
No mais, essa questão já foi tratada no item "II.2.2" supra, quando da análise da abusividade da cláusula 22ª da avença, de modo que os argumentos ali tecidos para fundamentar a necessidade de reinscrição da cláusula são também aqui aplicáveis.
Igualmente, no que concerne à abusividade decorrente da negativa de se devolver/restituir ao arrendatário os valores que adiantou a título de valor residual, em caso de rescisão contratual, a matéria já foi abordada no item "II.2.1" acima, reconhecendo-se a procedência dos argumentos do representante do MPF.
Embora ali se tenha analisado o direito à restituição do valor residual pago antecipadamente, isto é, antes do final do contrato, de forma diluída nas prestações representativas da taxa de arrendamento, na hipótese de o arrendatário optar, ao fim da avença, não pela compra do imóvel arrendado, mas por sua devolução, a tese então esposada é plenamente aplicável às situações antevistas pelas cláusulas ora em discussão (17ª e 18ª).
Com efeito, não obstante as cláusulas ora sob estudo vislumbrem hipóteses diversas de resolução do contrato, as quais implicam na extinção prematura do vínculo contratual que une arrendadora e arrendatário, em face da desistência deste, de seu inadimplemento ou da prática de algum ilícito contratual, não se pode olvidar que, no caso em riste, já se admitiu no presente decisum que o valor residual foi integralmente embutido nas prestações mensais da avença, de modo que, ao final do prazo estipulado para o arrendamento, mesmo para o arrendatário que opte por comprar o imóvel, não restará nada a ser pago à arrendadora.
Ora, nesses termos, não se pode fechar os olhos para o fato de que todos os arrendatários, logo no início do contrato, passaram a pagar à arrendadora, mensalmente, uma prestação em que se encontram embutidas a taxa de arrendamento e uma parcela do valor residual.
Sendo assim, nada mais justo que, uma vez resolvido o contrato, seja em face da opção do arrendatário por devolver o imóvel ao fim do prazo estipulado para o arrendamento, seja em vista da desistência deste ou por ter descumprido quaisquer das cláusulas contratuais, seja restituída ao arrendatário a quantia que pagou antecipadamente a título de valor residual.
Por óbvio, o valor da prestação mensal que representa efetivamente a taxa de arrendamento não deve ser devolvido/restituído ao arrendatário, pois seu pagamento decorreu do efetivo uso do imóvel.
Todavia, tratando-se de adiantamento do valor residual, repito, é inevitável a devolução ao arrendatário do pagamento antecipado feito a esse título, independentemente do motivo que levou à extinção prematura do vínculo contratual entre as partes, sob pena de enriquecimento ilícito da arrendadora, que vai reaver o bem arrendado, podendo dele usufruir da maneira que melhor entender.
No sentido de que, mesmo sendo a prática de ilícito contratual o motivo para a rescisão do contrato, é devida a restituição ao arrendatário do valor residual pago antecipadamente, trago à colação a ementa do seguinte julgado do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

"DIREITO COMERCIAL. CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL. LEASING.VALOR RESIDUAL GARANTIDO E VALOR RESIDUAL. DISTINÇÃO. COBRANÇA ANTECIPADA. IMPOSSIBILIDADE DE RETENÇÃO PELO ARRENDANTE NO CASO DE RESOLUÇÃO POR INADIMPLEMENTO DAS PARCELAS DO VALOR RESIDUAL ADIANTADAS PELO ARRENDATÁRIO. RECURSO DESPROVIDO.
I - No contrato de leasing, o "valor residual" é o preço contratual estipulado para o exercício da opção de compra, enquanto o "valor residual garantido" é obrigação assumida pelo arrendatário, quando da contratação do arrendamento mercantil, no sentido de garantir que o arrendador receba, ao final do contrato, a quantia mínima final de liquidação do negócio, em caso de o arrendatário optar por não exercer seu direito de compra e, também, não desejar que o contrato seja prorrogado.
II - As parcelas do "valor residual" adiantadas pela arrendatária durante a execução do contrato não podem ser retidas pela arrendante em caso de resolução com base em inadimplemento, com a reintegração do arrendante na posse do bem, somente sendo devida essa verba quando o arrendatário decide adquirir a coisa, exercendo a opção de compra.
III - O descumprimento contratual do arrendatário dá lugar à incidência das cláusulas penais avençadas entre as partes, podendo, em caso de haver demonstração concreta, redundar em ressarcimento e danos ocasionados pelo uso indevido dos bens, não sendo lícito ao arrendante reter o valor residual eventualmente adiantado.". (STJ, 4ª Turma, RESP 249340/SP, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 18/05/2000, DJ 07/08/2000, p. 116).

Destarte, tenho que as cláusulas 17ª e 18ª da avença contêm disposições abusivas, as quais, contudo, não devem levar à sua exclusão da avença, mas apenas à sua revisão, merecendo serem reinscritas nos termos abaixo expostos. Destaco, ainda, nesse pórtico, a necessidade de modificação também da cláusula 18º, no que pertine à afirmação da prescindibilidade de notificação do arrendatário para constituí-lo em mora, haja vista os argumentos tecidos no item "II.2.6" supra.
Eis, portanto, o teor das cláusulas em comento, após a revisão requerida a este Juízo (alterações em destaque).

"CLÁUSULA DÉCIMA SÉTIMA - DA DESISTÊNCIA POR PARTE DOS ARRENDATÁRIOS - Em caso de desistência do arrendamento, por interesse próprio, que deverá ser notificada, pelo ARRENDATÁRIO, com 30 (trinta) dias de antecedência, à ARRENDADORA, os valores pagos pelos ARRENDATÁRIOS a título de taxa de arrendamento serão apropriados como taxa de ocupação pelo uso do imóvel no período, cabendo-lhes direito apenas à devolução do valor que adiantou a título de pagamento do valor residual, apurado nos termos do parágrafo terceiro da Cláusula Décima Quinta. Em caso de apuração de valor residual negativo, será devido aos ARRENDATÁRIOS o montante correspondente ao valor positivo daquele apurado. Em todo caso, realizando os ARRENDATÁRIOS benfeitoria necessária no bem, ser-lhes-á devida a indenização respectiva.

Parágrafo único - Os ARRENDATÁRIOS deverão restituir o imóvel arrendado no mesmo estado de conservação e habitabilidade recebidos, salvo desgaste natural, comprovando a quitação de todas as demais obrigações contratuais, inclusive as relativas ao condomínio.".

"CLÁUSULA DÉCIMA OITAVA - DA RESCISÃO DO CONTRATO - Após a notificação do arrendatário, prevista na Cláusula Décima Nona, este contrato considerar-se-á rescindido nos casos abaixo mencionados, gerando, para os ARRENDATÁRIOS, a obrigação de pagar as taxas de arrendamento vencidas atualizadas na forma deste contrato, bem como a quitação das demais obrigações contratuais, sob pena de execução da dívida assim apurada, e de devolver, incontinente, o imóvel arrendado à ARRENDADORA, configurando a não devolução esbulho possessório, que enseja a adoção das medidas judiciais cabíveis, e multa fixada no inciso II da Cláusula Décima Nona deste instrumento.

I - descumprimento de quaisquer cláusulas ou condições estipuladas neste contrato;
II - falsidade de qualquer declaração prestada pelos ARRENDATÁRIOS neste contrato;
III - transferência/cessão de direitos decorrentes deste contrato;
IV - uso inadequado do bem arrendado;

V - destinação dada ao bem que não seja a moradia do ARRENDATÁRIO e de seus familiares.".


II.2.9 - Contrato de Adesão: violação ao art. 54, §§ 3º e 4º, do Código de Defesa do Consumidor.

No tocante às nulidades do contrato em apreço, aduziu por fim o órgão ministerial que, tratando-se de contrato de adesão, houve ofensa ao disposto no art. 54, §§ 3º e 4º, da legislação consumerista, na medida em que o instrumento não foi escrito com caracteres ostensivos e legíveis, a fim de facilitar ao consumidor a compreensão de seu conteúdo, a par de não terem sido destacadas as cláusulas que representam ônus aos arrendatários.
Em sua contestação, a CAIXA defendeu a regularidade do contrato, afirmando que foi redigido com letras de tamanho padrão e de forma clara, sem a utilização de termos que dificultassem a compreensão dos consumidores. Além disso, a palavra "arrendatário" foi sempre grafada com letras maiúsculas, chamando a atenção do consumidor para os textos que se referem a si.
Analisando cópia do contrato em testilha, especialmente aquela acostada às fls. 443/446 dos autos em apenso, observo que assiste razão à empresa estatal. Com efeito, no caso presente, o instrumento do contrato foi escrito com letras de tamanho razoável, não dificultando a dimensão destas, bem assim os termos utilizados na redação das cláusulas, a compreensão do consumidor acerca do que ajustado.
Ademais, foram realmente destacadas, em todo o texto, as palavras "arrendatário" e "arrendadora", procurando-se chamar a atenção do consumidor para aquelas cláusulas em que se encontra prevista obrigação ou direito seu.
Assim, tenho que, na hipótese em riste, não foram violados os §§ 3º e 4º do art. 54 do CDC, não merecendo acolhida o pleito do representante do MPF nesse sentido.


II.3 - DA RESPONSABILIDADE DA CAIXA E DA CONNÍVEL PELOS VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO

Na exordial, argüiu ainda o parquet a existência de sérios vícios construtivos nas unidades autônomas e nas áreas comuns que compõem o Residencial Sampaio Correia, tais como vazamentos, inclusive de caixas de gordura, infiltrações, rachaduras em pisos, paredes e tetos, ralos desnivelados, portas e janelas emperradas, ausência de registro de gás, entre outros, capazes de afetar a solidez e segurança da obra, conforme provas produzidas nos autos em apenso à inicial, asseverando, assim, a responsabilidade da CAIXA e da CONNÍVEL pelos mesmos.
A seu ver, a obrigação de a primeira reparar os danos causados aos arrendatários decorre de ser a gestora do PAR e, portanto, a responsável pela contratação da construtora CONNÍVEL para edificação do Condomínio, assim como de sua negligência na fiscalização da obra. Essa fiscalização, no seu entender, abrangeria não só a observância do cumprimento do cronograma físico-financeiro, ou seja, acompanhamento da obra para liberação dos recursos públicos ali aplicados, mas sim o acompanhamento da construção como um todo, inclusive da qualidade dos materiais nela empregados. Tal responsabilidade decorreria, ademais, do disposto nos arts. 186 e 927 do Código Civil brasileiro, assim como do estatuído no art. 14 do Código de Defesa do Consumidor.
A responsabilidade civil da CONNÍVEL, por seu turno, justifica-se diante do fato de ter construído o Condomínio com os vícios apontados, estando embasada no prescrito no art. 12 da legislação consumerista.
Em sua defesa, a empresa CONNÍVEL asseverou que a CAIXA fiscalizou a obra de construção do Residencial em debate, pois tal proceder era necessário à liberação dos recursos que financiaram o empreendimento, tendo a construtora utilizado materiais compatíveis com aqueles exigidos por tal empresa pública, de sorte que não merece prosperar a afirmação do órgão ministerial de que a obra foi mal executada.
Alegou, ainda, que várias das avarias referidas pelo parquet na inicial são decorrentes do uso dos imóveis, tais como manchas em pinturas, problemas no verniz das portas, arranhões na cerâmica, dentre outros, ressaltando que os arrendatários já se encontravam, ao tempo da contestação, há aproximadamente três anos residindo nos bens arrendados. Além disso, ocorreram alguns atos de vandalismo no Residencial, como a quebra proposital de telhas da cobertura do imóvel, o que causou algumas infiltrações.
Nesse passo, aduziu a empresa ré a plena habitabilidade dos imóveis que compõem o Condomínio Residencial Sampaio Correia, tanto que foi expedido o "Habite-se" pela SEMURB - Secretaria Especial de Meio-Ambiente e Urbanismo da Prefeitura de Natal, órgão reconhecido por sua competência.
Quanto ao laudo do CREA que embasou a decisão liminar proferida nos autos, sustentou a empresa demandada que o mesmo não concluiu pela existência de vícios de construção, mas apenas atestou a existência de avarias nos imóveis, com exceção do problema hidro-sanitário. Este, todavia, foi corrigido em meados de 2003, após a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta - TAC com a 41ª Promotoria de Justiça da Comarca de Natal, conforme demonstrado pelos documentos já acostados aos autos.
Afirmou, ademais, que os vícios de construção encontrados no interior dos apartamentos foram reparados, inclusive defeitos decorrentes de mau uso, como os problemas elétricos originados de ligações mal feitas realizadas pelos próprios arrendatários.
Aliás, quanto aos ditos vícios elétricos do empreendimento, observou que foram decorrentes do mau uso ou falta de manutenção por parte dos moradores do Residencial, já que a COSERN efetuou a ligação de eletricidade, o que não ocorreria se houvesse defeito de fabricação no sistema elétrico.
A CAIXA, por sua vez, defendeu-se afirmando que não lhe competia a fiscalização da qualidade da obra empreendida pela construtora CONNÍVEL, mas apenas verificar o regular andamento da mesma, ou seja, o cumprimento do cronograma físico-financeiro previsto para liberação das parcelas dos recursos. Argumentou, ainda, que o empreendimento foi analisado e aprovado pelos órgãos públicos competentes, não havendo que se falar em responsabilidade de tal empresa pública por vícios de construção.
Apreciando a questão com vagar, a priori, observo que, para que seja aquilatado se as empresas demandadas têm obrigação de reparar os defeitos apontados na inicial, encontrados nas unidades autônomas e nas áreas comuns do Residencial Sampaio Correia, necessário averiguar a presença de todos os elementos que compõem a responsabilidade civil objetiva, nos termos do art. 20 do Código de Defesa do Consumidor, legislação aplicável às relações jurídicas aqui discutidas, como assentado alhures.
De fato, é de mister analisarmos a presença dos três elementos característicos de tal modalidade de responsabilidade civil, quais sejam, prestação de serviço pelo fornecedor, ocorrência de dano e nexo de causalidade entre ambos, para concluirmos pela obrigação de reparação dos danos alegados, tudo independentemente da verificação de atuação culposa ou dolosa por parte do fornecedor.
Com efeito, a doutrina consumerista tem propugnado que, nos termos do pré-falado art. 20, o fornecedor de serviços, aqui incluídos os de construção civil e de natureza bancária, responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios para o consumo ou lhes diminuam o valor, independentemente da inexistência de culpa. E mais: em face do estatuído no art. 7º, § 1º, da mesma legislação, tal responsabilidade é solidária entre os fornecedores do serviço.2
In casu, no atinente à responsabilidade da CAIXA e da CONNÍVEL pelos supostos vícios de construção referidos na inicial, esta já foi reconhecida por dois dos magistrados que presidiram o feito. De fato, o Juiz Titular da Vara, reconhecendo de logo a responsabilidade da CONNÍVEL pelos vícios de construção existentes no empreendimento, obrigou-lhe, em sede de decisão antecipatória da tutela de mérito, a reparar em 30 dias os defeitos elétricos, os problemas de esgoto e os de vazamento no reservatório de água do Condomínio em comento. No mesmo decisum, assentou ainda a obrigação da CAIXA de acompanhar a realização das obras reparadoras.
Tal decisão, proferida às fls. 125/129, quanto à responsabilidade das empresas rés, foi assim vazada:
"08. Na hipótese sub examine, em uma análise perfunctória da questão, entendo caracterizada a plausibilidade do direito invocado na inicial. A responsabilidade da construtora por vícios de construção decorre do art. 20 do Código de Defesa do Consumidor. Por outro lado, no contrato firmado com a Construtora Connível, a CEF se obrigou a acompanhar a execução das obras (fl. 53 do processo em apenso), o que não poderia ser diferente, já que, conforme ressaltado acima, referida empresa pública atua como gestora do fundo. Assim, comprovadas diversas irregularidades na construção do Residencial Sampaio Correia (vide, dentre outros documentos o parecer técnico lavrado pelo Departamento de Vigilância Sanitária deste município - fls. 25/29 do processo 2003.84.00.9988-3), merece acolhida o primeiro pleito formulado em sede liminar.

09. Destaque-se que qualquer convenção tendente a eximir a construtora ou a CEF da responsabilidade pelos vícios de construção é, a princípio, nula de pleno direito, por tentar exonerar o fornecedor da responsabilidade pelos vícios do produto, consoante estabelece o art. 51, I, do Código de Defesa do Consumidor.

10. É importante ressaltar, ainda, que, na medida em que o ônus pela fiscalização da edificação do Residencial Sampaio Correia é da CEF, na condição de gestora do Fundo de Arrendamento Residencial - FAR, o que, decerto, inclui a fiscalização das obras de reforma ora determinadas, entendo desnecessária a providência requerida na exordial, no sentido de que seja apresentado projeto da obra em juízo. Esclareço, contudo, que a omissão ou falha do serviço da referida empresa pública no fiel cumprimento de seu mister, acarreta a responsabilidade solidária pelos vícios de construção, especialmente por ter sido ela a responsável pela inserção do produto no mercado.".

Válido mencionar que, no julgamento do Agravo por Instrumento nº 61915/RN, a 4ª Turma do Egrégio Tribunal Regional da 5ª Região, acompanhando o voto do relator, eminente Desembargador Federal Marcelo Navarro, manteve o referido decisum nessa parte, reconhecendo a responsabilidade civil da construtora pelos vícios de construção, ainda que tal previsão não conste do contrato de prestação de serviço firmado entre as partes, muito embora ressalvando a possibilidade de, na presente hipótese, a ré CONNÍVEL demonstrar, no curso da ação, que os defeitos referidos pelo parquet não decorreram da má execução da obra de engenharia.
Mais tarde, em face da recalcitrância da CONNÍVEL em cumprir a tutela antecipadamente deferida, sob alegação de que os vícios apontados já estavam sanados, o Juiz Federal Carlos Wagner Dias Ferreira, na decisão às fls. 493/499, reconheceu a responsabilidade solidária da CAIXA e da CONNÍVEL na reparação dos vícios decorrentes dos serviços que prestaram aos arrendatários do Residencial Sampaio Correia, determinando que a empresa pública ré promovesse as obras necessárias ao pleno aproveitamento das unidades habitacionais do Condomínio em apreço, especialmente os reparos dos vazamentos e infiltrações do telhado, das fissuras internas e da caixa d'água, ressalvando seu direito de regresso contra a CONNÍVEL.
Eis os termos desse novo decisum:

"22. Inicialmente, é mister frisar a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de arrendamento residencial, instituídos pela Lei nº 10.188/2001, da mesma forma que ocorre com os contratos de arrendamento mercantil, segundo jurisprudência já consolidada (STJ, 4ªT, AGRESP 656165, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, DJU 21/03/2005, pág. 402; STJ, 3ªT, AEDAGA 524462, Rel. NANCY ANDRIGHI, DJU 03/11/2004, pág. 200).

23. A CAIXA, a Abreu Imóveis Ltda e a CONNÍVEL Construções e Serviços Ltda, dessa forma, atuariam na posição de fornecedores de serviços e os arrendatários como consumidores, configurando a relação de consumo, respondendo cada um dos fornecedores solidariamente na hipótese da ocorrência de danos.
24. É que o Código de Defesa do Consumidor, em várias passagens, assegura a responsabilidade solidária dos fornecedores de serviços, podendo o consumidor acionar qualquer um dos participantes dessa cadeia, no caso de sofrer qualquer prejuízo, em razão do serviço prestado. É o que se pode extrair do art. 7º, parágrafo único, do CDC, que estatui, in verbis:

'Art. 7º. Os direitos previstos neste Código não excluem outros decorrentes de tratados e convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais de direito, analogia, costumes e eqüidade.
Parágrafo Único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.' (grifos acrescidos).

25. Assim,merece ser acatada a promoção ministerial.

26. A responsabilidade solidária da CAIXA decorre do fato desta atuar como gestora do fundo, conforme previsão do § 8º do art. 2º da Lei 10.188/2001. O parágrafo único do art. 4º dessa lei é ainda mais taxativo ao mencionar que :

'As operações de aquisição, construção, recuperação, arrendamento e venda de imóveis obedecerão aos critérios estabelecidos pela CEF, respeitados os princípio da legalidade, finalidade, razoabilidade, moralidade administrativa, interesse público e eficiência, ficando dispensada a observância das disposições específicas da lei geral de licitação.'(grifos acrescidos).

27. Dessa forma, a lei conferiu à CAIXA responsabilidades concernentes à elaboração de critérios de fiscalização das atividades de construção e recuperação dos imóveis objetos do programa de arrendamento residencial. Isso decorre, outrossim, da própria atribuição de gestora, que engloba a necessária observância da regularidade das especificações estabelecidas pela própria CAIXA, de forma a garantir a melhor aplicação das verbas destinadas ao programa, evitando qualquer prejuízo ao erário e aos beneficiários.

28. No programa de arrendamento residencial, entendido como o serviço prestado, há a participação de diversos fornecedores, tendo a CAIXA, como mencionado, a atribuição de gestão do fundo e fiscalização das especificações determinadas e a CONNÍVEL Construções e Serviços Ltda a de construção dos imóveis, devendo um ou outro ser provocado, no caso de descumprimento de alguma obrigação, decorrente do serviço, que venha a provocar ofensa aos beneficiários.

29. É mister ressaltar, na hipótese, a imensurável importância da CAIXA na relação de consumo em tela, porquanto devido o reconhecimento e reputação nacional, confere credibilidade ao serviço prestado, gerando no consumidor um sentimento de segurança na celebração contratual, não podendo, portanto, eximir-se de responsabilidade se a avença não foi devidamente cumprida.

30. Essa interpretação decorre da própria sistemática do CDC, que está calcado na elaboração de normas que têm como objetivo primordial a tutela do consumidor, parte considerada hipossuficiente na relação consumerista. Entendendo-se de forma diversa, estar-se-ia a violar direitos básicos de proteção ao consumidor e desconsiderando a sua situação de vulnerabilidade, reconhecida pelo art. 4º, inciso I, do CDC.

31.Em casos semelhantes, perfeitamente aplicáveis à espécie, as Cortes Regionais Federais vêm reconhecendo a responsabilidade solidária da Caixa Econômica Federal, conforme se observa nos acórdãos a seguir transcritos:

'ADMINISTRATIVO. SFH. DEFEITO DE CONSTRUÇÃO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA.
- A Caixa Econômica Federal, como agente financeiro, responde perante o mutuário adquirente de unidade habitacional pelo SFH, solidariamente com os demais co-obrigados, por defeitos de construção de obras que financiou em face do seu próprio dever de fiscalização.' (TRF 4ª Região, 2ª Seção, EIAC 16889, Rel. Juiz Amaury Chaves de Athayde, DJU 05/01/2005, pág. 78) (grifos acrescidos).

'CIVIL. CONTRATOS. CONSTRUÇÃO DE UNIDADES HABITACIONAIS COM RECURSOS DO SFH. INTERVENÇÃO E FISCALIZAÇÃO DA CEF. LEGITIMIDADE PASSIVA. SUPERFATURAMENTO DO VALOR DO IMÓVEL E DO CONTRATO DE MÚTUO.
- Nas ações que versam sobre empreendimentos imobiliários financiados com recursos do SFH, em que a Caixa atuou expressamente como interveniente anuente e fiscalizadora da obra e da comercialização das respectivas unidades habitacionais, a Construtora e a Instituição Financeira são responsáveis solidárias pela qualidade e segurança do negócio jurídico realizado junto ao adquirente-mutuário.' (TRF 4ª Região, 4ªT, AC 200404010160753, Rel. Juiz Edgard A. Lippmann Júnior, DJU 10/11/2004, pág. 776) (grifos acrescidos).".

Como se vê, bastantes foram os argumentos dos insignes magistrados para demonstrar a responsabilidade da construtora por eventuais defeitos do serviço de construção que prestou, independentemente da análise de sua culpa, nos termos do art. 20 do CDC.
Do mesmo modo, exaustivos foram os fundamentos para justificar, na presente hipótese, a responsabilidade da CAIXA por supostos vícios construtivos de imóveis pertencentes ao FAR, objeto do contrato de arrendamento residencial disciplinado pela Lei nº 10.188/2001, destacando-se o fato de que, embora não tenha sido a executora da obra, tinha o dever legal de fiscalizá-la e, a par disso, comercializou os imóveis, emprestando seu nome ao empreendimento e ao programa residencial em que este se encontra inserido, passando-lhe credibilidade e confiança em face de sua experiência no ramo imobiliário e de sua solidez.
Ademais, plenamente configurada se apresenta, na hipótese, a solidariedade entre o ente paraestatal e a CONNÍVEL, no que concerne ao dever de reparação, em face dos argumentos acima tecidos e do disposto no art. 7º, § 1º, do CDC.
Aliás, nesse sentido tem se posicionado os tribunais pátrios, como atestam os arestos ora colacionados:

"DANOS MORAIS E MATERIAIS. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL. REDE DE ESGOTO E CAIXA DE ELETRICIDADE. CONSTRUÇÃO FORA DAS NORMAS TÉCNICAS DE ENGENHARIA. RISCO À SAÚDE E SEGURANÇA DOS MORADORES. PRELIMINAR REJEITADA.
- Preliminar de ilegitimidade passiva levantada pela Caixa Econômica Federal rejeitada à vista de ser o imóvel adquirido através do Programa de Arrendamento Residencial (Lei nº 10.188/01, art. 4º, incisos IV e VI).
- Cuida-se de apelação cível interposta contra sentença que julgou procedente o pedido para condenar a Caixa ao ressarcimento em danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e danos materiais no valor de R$ 2.518,32 (dois mil, quinhentos e dezoito reais e trinta e dois centavos) a serem repartidos entre todos os autores. Tais condenações decorrem dos prejuízos sofridos com seus móveis e risco à saúde dos familiares dos demandantes ocasionados por falha no sistema de esgoto e na caixa de energia do condomínio adquiridos através do programa de arrendamento residencial da Caixa Econômica Federal.
- Verifica-se nos presentes autos nexo de causalidade entre os danos sofridos pelos requerentes e as falhas nas construções dos imóveis financiados pela demandada além da posterior omissão da CAIXA quando fora acionada para consertar as falhas. Nestes casos, basta ser provado o nexo de causalidade entre a ação do agente causador do dano e o evento danoso para surgir o dever de indenizar, ou seja, a construção fora das normas técnicas de engenharia.
- Na fixação da indenização por dano moral, o magistrado deve realizar uma estimação prudencial, considerando a gravidade do dano, a reputação da vítima, a sua situação familiar e sócio-econômica, as condições do autor do ilícito, etc, de modo que o valor arbitrado não seja tão grande que se transforme em fonte de enriquecimento da vítima e insolvência do ofensor nem tão pequeno que se torne inexpressivo e, assim, não atinja a finalidade punitiva da indenização.
- Considerando tais aspectos, há de se manter a sentença por seus próprios fundamentos. Preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada.
- Apelação improvida.". (TRF 5ª Região, 1ª Turma, AC 390327/RN, Relator Desembargador Federal José Maria Lucena, j. 25/10/2007, DJ 13/12/2007, p. 748, com grifos acrescidos).

"CIVIL. CONTRATO DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL. VÍCIOS NO IMÓVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. APLICAÇÃO DO CDC A INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS.
1. Contrato bancário de arrendamento residencial com opção de compra envolve relação jurídica de consumo, nos termos do CDC.
2. A presença de vícios no imóvel, que o tornam inabitável, enseja a nulidade do contrato e a responsabilidade da instituição que o arrendou, com a devolução das parcelas pagas.
3. A mera assinatura de contrato de recebimento onde consta menção a vistoria não configura prova bastante da integridade de imóvel, pois é condição à entrega das chaves ao arrendatário.
4. Recurso desprovido.". (JEF, 1ª Turma Recursal DF, RC 200433007211406/DF, Relator Juiz Federal Wilson Alves de Souza, j. 03/08/2004, com grifos acrescidos).

Portanto, demonstrado que, uma vez configurado o dano decorrente da má construção, seriam a CAIXA, na condição de gestora do PAR, e a CONNÍVEL, construtora do empreendimento, responsáveis pela reparação dos prejuízos causados aos consumidores, decorrentes de sua atividade, passemos à análise da presença dos demais requisitos configuradores da responsabilidade buscada pelo parquet.
Nesse diapasão, no tocante aos defeitos existentes nas unidades autônomas do Condomínio Residencial em comento e nas suas áreas comuns, apontados na inicial (vazamentos; infiltrações; rachaduras em pisos, paredes e tetos; desnivelamento de ralos, portas e janelas, as quais emperram; ausência de registro de gás; vazamento de caixas de gordura; problemas de esgoto; defeitos elétricos e vazamento do reservatório de água), observo que foram colacionados aos autos diversos documentos pelas partes, seja para atestar sua persistência, seja para demonstrar sua efetiva reparação, como também para comprovar que não decorreram da má execução da obra de engenharia. Destarte, necessária se faz a análise de todos esses dados.
Principiando pelo laudo referido na inaugural pelo órgão ministerial, resultante de vistoria realizada no Residencial Sampaio Correia por representante do CREA (fls. 339/340 dos autos em apenso), verifico que ali foram atestados diversos defeitos nas áreas autônomas e comuns do Condomínio, ficando claro que alguns deles são decorrentes da má qualidade da construção, enquanto outros advêm do mau uso ou conservação dos equipamentos que guarnecem o Residencial.
Com efeito, embora a fiscal do CREA não tenha inserido em seu relatório um tópico denominado "conclusão", da leitura do mesmo se infere com insofismável clareza que, tecnicamente, vários dos defeitos que mencionou decorrem da má execução do empreendimento. De fato, destes se excluem apenas as citadas avarias das caixas de energia externas, que, como aduzido pela CONNÍVEL em sua defesa, com certeza não foram entregues nessas condições; o problema da fiação proveniente da guarita; e os defeitos relatados pela fiscal apenas em face de alegações dos arrendatários, os quais não foram efetivamente constatadas pela engenheira civil.
Nesse pórtico, relativamente ao problema dos fios de energia provenientes da guarita para alimentar a casa de lixo, que, no momento da vistoria, encontrava-se em execução, tenho que a irregularidade se justifica por essa circunstância peculiar, ou seja, o fato de a área encontrar-se em obra.
Ademais, no atinente aos itens incluídos pela fiscal do CREA com base apenas em alegações dos arrendatários, a exemplo dos problemas no sistema de interfone e no motor do portão automático, observo que, decerto, não podem ser considerados decorrentes do serviço de construção prestado pela CONNÍVEL, sob a fiscalização da CAIXA, haja vista que não foram demonstrados sua efetiva ocorrência e o nexo causal. A par disso, não foram citados na inicial, não sendo abarcados pelo presente decisum.
Outrossim, quanto ao problema elétrico no apartamento 103 do bloco 03, concernente a descargas elétricas e suposta condução de eletricidade pelas paredes de tal unidade habitacional, decorrentes da presença, no local, do quadro de energia elétrica do bloco, embora o mesmo tenha sido referido pela fiscal do CREA com base apenas em denúncias dos arrendatários, foi objeto de perícia determinada pelo Juízo, já que novamente suscitado pelo perito judicial, após a realização de sua primeira inspeção.
Tal perícia, realizada por engenheiro elétrico contratado pela CONNÍVEL, acompanhado de equipe do Corpo de Bombeiros, apontou a inexistência do problema alegado (ver relatórios às fls. 626/629), de sorte que o suposto defeito deve ser descartado como vício construtivo a ser reparado pelas empresas rés.
Noutra quadra, tenho que um dos itens apreciados pela fiscal do CREA na vistoria realizada no Condomínio por solicitação do parquet merece especial atenção. Diz respeito aos problemas hidro-sanitários decorrentes da má construção da rede de esgotamento e da utilização de material inadequado. Tais problemas, reconhecidos pela CONNÍVEL antes do ajuizamento da presente causa, foram objeto, segundo referida ré, de Termo de Ajustamento de Conduta - TAC firmado com a 41ª Promotoria de Justiça da Comarca de Natal, estando atualmente sanados.
Compulsando os autos em apenso, observo que, também nesse aspecto, assiste razão à requerida. É que, embora os defeitos hidro-sanitários do empreendimento tenham sido detectados pelo Setor de Vigilância Sanitária da Secretaria Municipal de Saúde, conforme pareceres técnicos acostados às fls. 25/29 e 701/704, datados de dezembro de 2002 e março de 2003, respectivamente, assim como pela CAERN - Companhia de Água e Esgoto do Rio Grande do Norte, consoante relatório de inspeção juntado às fls. 708/715, além de ter sido atestado pela CAIXA, nos termos do documento às fls. 734/740, em que se assentou a necessidade de a CAERN corrigir os problemas da rede coletora pública e a CONNÍVEL, os da rede coletora interna do Condomínio, reconhecidamente mau executada, os defeitos apontados já foram sanados, em cumprimento ao Termo de Ajustamento de Conduta mencionado pela CONNÍVEL, travado entre esta, a CAERN e a 41ª Promotoria de Justiça da Comarca de Natal, cuja cópia foi acostada às fls. 351/352.
De fato, em face desse TAC, a construtora demandada apresentou projeto executivo para reconstrução da rede de esgotamento interno do Residencial em apreço (cópia às fls. 308/310), executando-o, tendo o Setor de Engenharia da CAIXA atestado o cumprimento, pela mesma, da obrigação assumida perante o Ministério Público Estadual (fl. 788), embora destacando que a solução definitiva dos problemas hidro-sanitários do Condomínio Sampaio Correia permanecesse na dependência da conclusão, pela CAERN, da revisão da rede de esgotamento externa, conforme compromisso assumido no mesmo TAC.
Por outro lado, estudando os autos principais, verifiquei que a CONNÍVEL acostou, às fls. 154/157 e 162, respectivamente, cópias do contrato que travou com a empresa CONSTRUTORA RETA LTDA. para execução de serviços no sistema de esgotamento sanitário do Residencial em testilha e do termo de recebimento de obra firmado pela CAERN, em favor da empresa que contratou para executar os serviços que ficaram a seu cargo no TAC travado com o Ministério Público Estadual, demonstrando satisfatoriamente que reparou tal vício de construção detectado no empreendimento em apreço.
Portanto, diante dessa documentação, tenho que, embora existissem defeitos hidro-sanitários no Condomínio Residencial Sampaio Correia, decorrentes da má execução da sua rede de esgotamento sanitário, além de problemas da rede pública de esgotamento, tais vícios já foram corrigidos pela construtora demandada, restando prejudicado o pleito do parquet nesse sentido.
Entretanto, não é sobre estes vícios construtivos que gira a maior controvérsia travada nestes autos. Com efeito, a maior divergência entre as partes diz respeitos aos demais defeitos apontados no relatório da engenheira civil representante do CREA, especialmente na origem das fissuras, dos vazamentos e das infiltrações encontradas nas unidades habitacionais e nas áreas comuns do Condomínio em comento.
Relativamente às fissuras, tanto a CAIXA como a CONNÍVEL refutaram tratar-se de vício construtivo, embasadas em laudo técnico de engenheiro que contrataram para estudar as rachaduras, cuja cópia foi acostada às fls. 159/161. Ali se concluiu que as fissuras encontradas na obra vistoriada não ultrapassam 0,1 mm, estando dentro dos padrões de valores de abertura, de modo que não indicam colapso estrutural da obra nem influenciam na sua qualidade e durabilidade.
Não obstante esse resultado, a já referida vistoria realizada pelo CREA (fls. 339/340 dos autos em apenso) constatou sim a excentricidade das fissuras existentes nas lajes dos apartamentos, destacando que uma delas podia ser vista no piso do andar superior.
Do mesmo modo, na inspeção realizada pelo Corpo de Bombeiros no local, a pedido da ATMIPAR-RN, a existência das fissuras foi ressaltada pelo engenheiro civil responsável pela vistoria (fls. 371/376), que apontou que a presença de infiltrações no local onde aquelas se encontravam afetava a instalação elétrica do Residencial, podendo causar princípio de incêndio.
Ademais, o primeiro laudo preliminar apresentado pelo perito designado pelo Juízo (fls. 544/556) igualmente apontou para a existência de grandes fissuras nas unidades do empreendimento, bem assim nas áreas comuns. De fato, registrou-se no documento que:

"Nas áreas internas pode-se observar um fato, do ponto de vista estrutural, no mínimo curioso. A existência de fissuras transversais nos corredores de todos os blocos. Surpreende o fato pela existência de juntas de dilatação próximo ao local e as fissuras geralmente são explicadas por dilatações térmicas de produtos com coeficientes térmicos diversos, mas, tais variações, deveriam ser absorvidas pelas juntas de dilatação.

(...)

Tratando-se dos pisos faz-se mister uma análise mais detalhada das condições estruturais dos prédios em função das inúmeras fissuras existentes, tanto nos corredores quanto dentro dos apartamentos, com atenção especial àquelas localizadas nas extremidades de alguns ambientes."

Também no segundo laudo preliminar apresentado pelo perito judicial (fls. 641/648), restou destacado o grave problema das fissuras existentes nos pisos das unidades habitacionais do Residencial Sampaio Correia, merecendo transcrição os trechos do relatório que dizem respeito a tal defeito. Vejamos:

"3 - quanto às fissuras dos pisos, tanto na área interna dos apartamentos quanto nos corredores, pode se observar que algumas providências foram tomadas sem, no entanto, haver conclusão dos serviços dado que ainda não houve a reposição das cerâmicas retiradas para o efetivo conserto;

4 - também vale destacar que em alguns casos, mesmo havendo a retirada da cerâmica, o capeamento do piso, à base de argamassa de cimento, apresenta novas fissuras;

(...)

Quanto às fissuras apresentadas nos pisos e paredes não podemos informar com segurança que as medidas tomadas sejam suficientes para solucionar os problemas, pois no próprio piso recuperado, sem a reposição da cerâmica, já podemos ver novas fissuras."

Embora as vistorias realizadas pelo servidor do Juízo habilitado a tanto tivessem por escopo a verificação do cumprimento, pelas rés, da liminar deferida nos autos, não se pode olvidar que ali restou assentado, em duas ocasiões distintas, a gravidade das fissuras presentes nas lajes, paredes e pisos das unidades habitacionais do Condomínio em apreço, mormente daquelas verificadas nos pisos que, como anunciado, apresentam-se mesmo após a retirada das cerâmicas que os revestem.
Assim, não vejo como acolher os argumentos da CAIXA e da CONNÍVEL no sentido de que tais fissuras não representam defeito de construção, de modo que as tenho como vícios construtivos, que devem ser indenizados por ditas rés.
Do mesmo modo, a prova dos autos é no sentido de que as infiltrações e vazamentos verificados nas diversas vistorias realizadas no empreendimento são decorrentes de sua má construção. Com efeito, já no relatório elaborado pela fiscal do CREA (fls. 339/340 dos autos em apenso), a engenheira civil que inspecionou a obra apontou a existência de vazamento no "castelo d'água", bem como de infiltrações nos banheiros e nas paredes dos apartamentos, estas últimas em decorrência da má vedação das janelas.
Também na inspeção realizada no local em maio de 2005 pelo Corpo de Bombeiros, verificou-se a presença e a gravidade das infiltrações acima referidas, encontradas nos apartamentos e corredores de alguns blocos, nos locais das fissuras e nas juntas de dilatação dos prédios, atestando-se que as mesmas já estavam a afetar as instalações elétricas do residencial, "podendo causar princípios de incêndio" (fls. 371/376 destes autos). Apontou-se igualmente, neste relatório de vistoria técnica, a presença de grande vazamento nas paredes laterais do reservatório de água do condomínio.
Como se tanto não bastasse, na primeira inspeção realizada pelo perito judicial para verificação do cumprimento, pelas rés, da decisão antecipatória da tutela de mérito proferida nos autos, igualmente se constatou a presença das infiltrações e vazamentos ora tratados. De fato, no laudo preliminar apresentado, apontou o perito (fls. 544/556):

"Quanto ao revestimento externo, embora utilizado material cerâmico que geralmente oferece uma boa impermeabilidade, apresenta inúmeros quadros de infiltração trazendo diversos transtornos aos usuários dos prédios e prejudicando a vida útil do revestimento interno.

(...)

Nos banheiros e cozinhas o fato comum reside nas inúmeras infiltrações originadas por tubulações, principalmente de esgoto, e, no último pavimento, fruto dos problemas detectados nas telhas e calhas da cobertura.".

Da leitura de todos esses relatórios de vistoria, constata-se que desde as primeiras inspeções realizadas no empreendimento, por volta dos anos de 2003/2004, quando a obra contava com cerca de 3 anos, já foi possível verificar a presença dos problemas de fissuras, infiltrações e vazamentos aqui estudados. Ora, tratando-se de construção praticamente nova, a existência de tais problemas já denota que sua origem não decorre de mau uso ou decurso de tempo, mas sim de má construção. Essa conclusão resta corroborada pelo fato de os problemas se apresentarem não em um bloco ou apartamento isoladamente, mas em todo o empreendimento, ou seja, nas unidades habitacionais que compõem os cinco blocos que constituem o Condomínio Residencial em apreço, assim como nas áreas comuns do Residencial.
Além disso, nas informações prestadas pela CAIXA acerca do cumprimento da liminar deferida pelo Juízo (fls. 606/622), ficou demonstrado que, para eliminação dos problemas apresentados no empreendimento em tela e pleno aproveitamento das unidades habitacionais que compõem o Residencial Sampaio Correia, foram necessários serviços reparadores minuciosos, que denotam a precariedade da construção do empreendimento. Exemplo disso é o fato de ter sido necessário realizar reparo para controle de alagamento de área seca por água de banho; reparo do piso do box para correção do caimento para o ralo; reparo da rede de esgoto para eliminar refluxo de águas servidas; reparo de soleira para controle de alagamento; dentre outros.
Diante desse conjunto probatório, tenho que restou devidamente comprovado que, na espécie, os defeitos hidro-sanitários, de fissuras, de vazamentos e de infiltrações encontrados no Condomínio em comento caracterizam-se como vícios de construção, ensejando a responsabilização da empresa CONNÍVEL e da CAIXA pela sua reparação.
Com efeito, em face dessas provas, não subsistem as alegações das demandadas no sentido de que, se os problemas detectados decorressem de má construção, o empreendimento não teria recebido o "habite-se" da Prefeitura Municipal e do Corpo de Bombeiros, assim como autorização da COSERN para ligação de energia. É que, não obstante tenha sido declarada a habitabilidade do Residencial assim que concluída a obra, os problemas construtivos não tardaram em aparecer, a exemplo do grave problema hidro-sanitário, reconhecido e sanado pela empresa CONNÍVEL, sob fiscalização da CAIXA, antes mesmo do ajuizamento desta ação.
Do mesmo modo, os documentos juntados aos autos pela CONNÍVEL (fls. 163/230), com o objetivo de demonstrar que os reparos internos solicitados na presente causa em prol dos arrendatários já foram realizados, não se mostraram suficientes para tal. A uma, porque não referiram os serviços prestados a cada arrendatário. E a duas, porque as informações prestadas nos autos por peritos, inspetores e pela própria CAIXA acerca dos serviços de reparação necessários ao pleno aproveitamento das unidades habitacionais que constituem o Condomínio Residencial Sampaio Correia dão conta de que as obras de reparação pleiteadas na presente demanda apresentavam-se mesmo necessárias.
Outrossim, também em face desse escorço probatório, tenho que deve ser confirmada a antecipação de tutela deferida ab initio, posto que presentes os requisitos para tal (art. 84, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor). Aliás, para dar cumprimento a esta, a CAIXA já vem realizando os reparos necessários à plena habitabilidade das unidades autônomas do Condomínio em referência, de sorte que, por ocasião do cumprimento da sentença, caber-nos-á exigir a comprovação da satisfação da obrigação reconhecida judicialmente.
Nesse passo, importante frisar que, tendo a CAIXA se responsabilizado sozinha pelo cumprimento da antecipação de tutela deferida, poderá exercer o direito de regresso contra a CONNÍVEL, uma vez confirmado este decisum, pois reconhecida a responsabilidade solidária de ambas pela reparação dos prejuízos causados aos adquirentes das unidades habitacionais do Residencial em comento.


II.4 - DA ADMINISTRAÇÃO DO CONDOMÍNIO PELOS ARRENDATÁRIOS

Por fim, argumentou o órgão ministerial a necessidade de que os adquirentes das unidades do Residencial Sampaio Correia sejam responsáveis pela administração do Condomínio, assim como pela aprovação de suas normas internas, afastando-se a validade do contrato travado para tal entre a CAIXA e a empresa ABREU IMÓVEIS, haja vista que serão os futuros proprietários do imóvel que arrendaram, apresentando mais interesse do que a CAIXA na solução dos problemas cotidianos do Condomínio. Além disso, com o reconhecimento desse direito aos arrendatários, deixariam de pagar à ABREU IMÓVEIS a vultosa quantia que despendem mensalmente a título de taxa de administração.
Para defender essa necessidade de administração do Condomínio pelos próprios arrendatários, citou o parquet que, com a administração a cargo da ABREU IMÓVEIS, chegou-se a atrasar o pagamento de contas de energia elétrica de um dos blocos, sujeitando-se as unidades habitacionais respectivas à corte de energia, quando havia recursos na conta do Condomínio suficientes à quitação de tais obrigações. Ademais, embora o Condomínio seja ocupado por cidadãos de baixa renda, é bastante elevado o valor cobrado a título de taxa de administração, não se justificando esse dispêndio de recursos quando os próprios arrendatários, futuros proprietários dos imóveis arrendados, poderiam administrar desde logo o Condomínio.
Ainda para justificar a legitimidade da administração do Condomínio pelos arrendatários, asseverou o representante do MPF o caráter inovador do contrato de arrendamento residencial, em que os consumidores titularizam direitos assemelhados aos dos locadores, dos compradores ou dos promitentes-compradores, sem caracterizar-se como qualquer um desses, quando deveria ser equiparado ao promitente-comprador, já que o objeto do contrato em comento é efetivamente a aquisição final do bem pelo arrendatário. Desse modo, assim como os promitentes-compradores, teriam os arrendatários direito ao exercício das funções normativas e administrativas do Condomínio.
Noutro pórtico, agora para demonstrar o abuso na contratação da ABREU IMÓVEIS para administrar o Condomínio, informou o representante do MPF que ficou estipulado no contrato travado entre a CAIXA e a ABREU IMÓVEIS que a remuneração desta seria proporcional às despesas efetuadas pelo Condomínio, o que, segundo os arrendatários, estimula a ré ABREU IMÓVEIS a aumentar os encargos condominiais, a fim de aumentar sua contra-partida. Exemplo disso foi que, em um ano, a taxa de condomínio aumentou 50% e a remuneração da empresa administradora do condomínio aumentou em 100%, tudo sem consentimento ou consulta aos arrendatários.
Em sua contestação, a CAIXA defendeu o seu direito à administração dos imóveis que compõem o Residencial Sampaio Correia, já que lhe pertencem enquanto em curso o prazo do contrato de arrendamento, afirmando, nesse passo, o equívoco do órgão ministerial ao denominar o Residencial como condomínio, pois, a seu ver, como todas as unidades habitacionais lhe pertencem, não há que se falar em co-propriedade.
Ademais, ainda que houvesse condomínio, seria aplicável o art. 1.333 do Código Civil, cuja redação é semelhante a do art. 17 do Regimento Interno do Condomínio.
Outrossim, asseverou o ente paraestatal a impossibilidade de se tomar o contrato como sendo de promessa de compra e venda, pois, nessa hipótese, não seriam aplicáveis as normas do PAR, mas sim dos contratos de mútuo financeiro, o que só prejudicaria os arrendatários do Residencial Sampaio Correia.
De outra banda, aduziu a empresa pública federal a regularidade do contrato de prestação de serviço que travou com a ABREU IMÓVEIS, ressaltando que foi firmado após o devido processo licitatório e que a remuneração da administradora está dentro dos parâmetros normais, sendo proporcional à arrecadação de taxas de manutenção e não às despesas, como alegado pelo autor.
Embora a empresa ABREU IMÓVEIS não tenha contestado o pedido inicial, manifestou-se nos autos quando intimada para pronunciar-se sobre o pleito de antecipação de tutela (fls.72/87), ocasião em que alegou a regularidade do contrato travado com a CAIXA para administração do Residencial Sampaio Correia, mormente por esta representar os interesses do fundo proprietário das unidades habitacionais, nos termos da legislação que rege a matéria, ressaltando ainda o fato de que a celebração foi precedida do necessário procedimento licitatório.
Ademais, refutou as afirmações do parquet, no sentido de que a empresa ré utilizou a taxa de condomínio para custear reparos na obra; vem gerindo mal o Residencial; aumentou unilateralmente a sua remuneração; e não tem permitido a participação dos arrendatários nas decisões sobre o condomínio.
Nesse sentido, asseverou que o representante do MPF em nenhum momento apontou, na exordial, quais as obras de reparo que foram custeadas pelas taxas de condomínio, o que realmente não estava a seu alcance, já que nenhuma obra de reparo foi assim remunerada.
Além disso, argumentou que não houve aumento excessivo da taxa de condomínio durante o ano de 2004, mas uma oscilação mínima dessa taxa, decorrente exclusivamente do nível de consumo de água.
Outrossim, afirmou não ser verdade que as decisões administrativas são tomadas sem consulta ou consentimento dos arrendatários, fazendo prova de que estes participam de tais decisões através das atas das assembléias do Condomínio.
Por fim, com relação ao atraso no pagamento da conta de energia de um dos blocos que compõem o Residencial, justificou a empresa demandada que o corte de energia ocorreu porque, ao tempo da construção, foi feito mais de um cadastro do Residencial na COSERN e, como não tinha conhecimento da existência dessa segunda conta de energia, cuja cobrança não chegava à administradora, a fatura não foi adimplida no tempo oportuno. Todavia, ao tomar conhecimento do fato, foi providenciada a regularização da inscrição do Residencial na COSERN, não decorrendo, portanto, o aludido corte de energia de má-gestão da administradora.
Analisando as alegações das partes, tenho que o pleito do Ministério Público Federal não merece prosperar. Isso porque, a meu sentir, assiste razão à CAIXA e à empresa ABREU IMÓVEIS quando aduzem que aquela representa o proprietário dos imóveis que compõem o Residencial Sampaio Correia, cabendo-lhe, em face disso, a administração dos mesmos.
Com efeito, segundo a Lei nº 10.188/2001, art. 2º, os bens imóveis objeto do arrendamento residencial ali previsto pertencem ao FAR, o qual é gerido pela CAIXA, instituição financeira que mantém a propriedade fiduciária dos mesmos durante o prazo do arrendamento. Logo, na condição de proprietária dos bens, justa sua pretensão de exercer o direito de administrá-los.
De fato, embora os arrendatários objetivem adquirir os imóveis arrendados, não podem ser equiparados a promitentes-compradores, pois, ao término do contrato que travaram com a CAIXA, poderão optar por devolver o bem arrendado ou prorrogar o contrato, ao invés de adquirir o imóvel, não sendo, portanto, certa a ocorrência desta compra. E mais: pelos motivos previstos na avença, pode até mesmo o contrato ser rescindido prematuramente, hipótese em que o arrendatário nem mesmo terá a possibilidade de optar pela compra do imóvel.
Nesses termos, não vejo como retirar a administração dos imóveis daquela que detém a propriedade sobre os mesmos e transferi-la para outrem, detentor de mera posse sobre os bens, se tal fato não foi autorizado ou desejado pelo proprietário, mormente no presente caso, em que, como destacado acima, não é certa a transferência da propriedade do bem ao arrendatário.
Igualmente não vislumbro como rechaçar o direito da CAIXA de estabelecer o Regimento Interno e a Convenção do Condomínio, embora essa co-propriedade ainda não exista, como ressaltado pela empresa pública. É que, se a instituição financeira representa o proprietário dos imóveis e, para sua administração, prefere normatizar a forma como essa gestão se dará, não vejo óbice a que exerça este direito. Enquanto os imóveis pertencerem ao FAR, a CAIXA tem liberdade para administrá-los como bem entender, desde que dentro da legalidade.
Na hipótese, a par de se encontrar nos limites da legalidade a atuação da CAIXA na administração dos bens que pertencem ao FAR, não se pode olvidar que a normatização da administração do Condomínio serve antes para resguardar o interesse dos arrendatários do que para prejudicá-los, já que claras e delimitadas as regras que regerão a gestão dos imóveis.
De qualquer sorte, quando mais de 2/3 (dois terços) dos imóveis que compõem o Residencial Sampaio Correia não mais pertencerem ao PAR, a administração do Condomínio passará a ser exercida por síndico eleito por assembléia dos condôminos, nos termos do art. 17 do Regimento Interno do Residencial (fls. 317/327). Nessas circunstâncias, nos termos do art. 4º do mesmo Regimento, a Convenção do Condomínio poderá ser alterada, observados os requisitos ali previstos, de modo que, não se agradando os então proprietários do Residencial com algumas das disposições da Convenção, poderão alterá-las.
Outrossim, no que concerne à alegação do órgão ministerial de que a CAIXA não detém condições técnicas para administrar os imóveis em questão, tenho-a por prejudicada, na medida em que não é a instituição financeira que vem administrando o Residencial Sampaio Correia, mas a ABREU IMÓVEIS, empresa especializada na área, contratada para tal fim pela representante do fundo proprietário dos bens arrendados, haja vista as normas previstas no Regimento Interno do Condomínio.
Nesse diapasão, convém afirmar a regularidade do contrato travado entre a CAIXA e a ABREU IMÓVEIS (cópias às fls. 299/309), rechaçando os argumentos do parquet em sentido contrário. A uma, porque, nos termos do parágrafo 1º do art. 17 do pré-falado Regimento Interno do Condomínio, enquanto o FAR detiver a propriedade de, no mínimo, 2/3 (dois terços) das unidades autônomas do Residencial, o síndico será obrigatoriamente pessoa jurídica indicada e contratada pela CAIXA. E a duas, porque, como demonstrado pelas demandadas, o ajuste foi precedido de procedimento licitatório.
Também no que atine à gestão da ABREU IMÓVEIS na administração do Residencial em comento, não vejo qualquer irregularidade. Primeiro, porque o representante do MPF não demonstrou que a administradora tenha efetivamente utilizado a taxa de condomínio para realizar reparos no Residencial, como alegou na inicial. A respeito, justificou a ABREU IMÓVEIS que pagou com tais recursos obras destinadas à manutenção do Condomínio, tais como limpeza de fossa e de caixa de gordura.
Segundo, porque, ao contrário do alegado pelo órgão ministerial, a ABREU IMÓVEIS comprovou, com as Atas de Assembléias realizadas com arrendatários, que tem se empenhado na redução das despesas do condomínio, embora sua remuneração consista num percentual sobre o total das despesas realizadas, bem assim que tem buscado a anuência destes para aquisição de melhorias que aumentariam o valor da taxa de condomínio. Além disso, não restou provado nos autos o excessivo valor da taxa de condomínio, sem razão para tal, como asseverou o autor.
Terceiro, porque, relativamente ao episódio do corte de energia elétrica em um dos blocos que compõem o Residencial, a ABREU IMÓVEIS esclareceu o que acarretou o problema, demonstrando que não decorreu de desídia sua na administração do Condomínio.
Por derradeiro, a respeito desse tópico, releva destacar que, nos autos do Agravo por Instrumento nº 61927/RN, relatado pelo Eminente Desembargador Marcelo Navarro, a 4ª Turma do Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região decidiu manter a ABREU IMÓVEIS na administração do Condomínio, confirmando o efeito suspensivo conferido pelo relator à decisão de primeiro grau acostada às fls. 125/129, em que se afastou a referida ré da administração do Residencial.


III - DISPOSITIVO

DIANTE DO EXPOSTO, com fulcro no art. 269, I, do Código de Processo Civil brasileiro, julgo parcialmente procedente o pedido formulado na inaugural, para declarar, em face de sua abusividade, a nulidade das cláusulas contratuais nºs. 5; 15, §§ 5º e 7º; 16, § 2º; 17; 18; 19, caput, inciso II, b, e §1º; 20, alínea c; 21, parágrafo único; 22 e 24 do contrato-tipo travado entre a CAIXA e os adquirentes das unidades habitacionais do Condomínio Residencial Sampaio Correia. Em conseqüência, determino sejam excluídos das avenças o parágrafo 1º da cláusula 19ª, a alínea c da cláusula 20ª e a cláusula 24ª, devendo as demais disposições contratuais reputadas abusivas ser reinscritas nos termos referidos na fundamentação desta sentença.
No mesmo passo, reconheço a responsabilidade solidária da CAIXA e da empresa CONNÍVEL pela reparação dos danos causados aos adquirentes das unidades autônomas do Residencial em comento, em decorrência da má construção do empreendimento, condenando ambas a promover as obras de engenharia necessárias à reparação dos defeitos de fissuras, vazamentos e infiltrações constatados nas unidades autônomas e nas áreas comuns do Condomínio.
Em sede de antecipação de tutela, ratificando as decisões anteriormente prolatadas, determino que a CAIXA e a CONNÍVEL, no prazo de 60 (sessenta) dias, concluam os reparos necessários à eliminação de fissuras, vazamentos e infiltrações nas unidades habitacionais e nas áreas comuns do Residencial Sampaio Correia, inclusive as obras de acabamento. De logo, fixo multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a incidir na hipótese de descumprimento da medida ora deferida antecipadamente.
Condeno, ademais, a CAIXA e a CONNÍVEL ao pagamento das custas e despesas processuais.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Natal, 18 de março de 2008.


GISELE MARIA DA SILVA ARAÚJO LEITE,
Juíza Federal Substituta da 4ª Vara



1 Nesse sentido, consultar os seguintes julgados: EREsp 286649/RS (2001/0189340-6; decisão: 07/05/2003; DJ: 29/09/2003, p.00135), EREsp 245704/SP (2002/0028324-4; decisão: 07/05/2003; DJ: 29/09/2003, p.00135), EREsp 213828/RS (2001/0067779-5; decisão: 07/05/2003; DJ: 29.09.2003, p. 135).

2 GRINOVER, Ada Pellegrini et alli. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto. 7 ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001; e MARQUES, Cláudia Lima et alli. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. 1 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.


PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO GRANDE DO NORTE
4ª V A R A


Sentença Tipo A
Proc. 2004.84.00.008808-7

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